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Sumário
Enquadramento e noção conceitual
As fundações de apoio, segundo parte da doutrina, tiveram sua ampliação a partir do incremento do Terceiro Setor. Nesse sentido, escreve Rafael Garofano:
“Nos últimos anos, o denominado terceiro setor tem avançado sobremaneira, valendo destacar a figura das fundações de apoio, que são entes dotados de personalidade jurídica de direito privado, sem fins lucrativos, que exercem atividades de interesse público mediante a colaboração e o apoio a determinadas instituições. Essas fundações não integram a Administração, mas com ela mantém convênios, ajustes e contratos, sempre com o objetivo de cooperação com a entidade pública no desempenho mais eficiente das funções que lhe foram atribuídas por lei. Ainda na função fomento, são inúmeras as modalidades de contratos capazes de possibilitar a participação dos particulares no desempenho de atividades de interesse geral, a exemplo dos contratos de incentivo, contratos de inovação, dos consórcios de desenvolvimento de pesquisas ou clusters tecnológicos.” [1]
Sobre essa estrutura o autor adverte que não são organizações da sociedade civil, nem mesmo organização do Terceiro Setor, tendo em vista sua origem na própria Administração Pública:
“São órgãos constituídos por universidades públicas. Não obstante sejam registradas em cartórios como fundações de direito privado, nos parece equivocada essa técnica, visto que não surgem da forma prescrita pelo Código Civil, isto é, não são criadas por testamento, nem por escritura pública. São criadas por afetação de patrimônio público, através de atos administrativos de administradores públicos e com o objetivo de fomentar e dar suporte a instituições de ensino públicas.
A Lei nº 8.958/94 sequer prevê um procedimento de qualificação das fundações de apoio, bastando determinação de seus instituidores – que, lembre-se, são dirigentes das universidades públicas e, portanto, agentes públicos – para que sejam consideradas como tal. “[2]
Embora tecnicamente não se vislumbre como afirmar que essas entidades de apoio são “órgãos públicos” regulares, é certo que tais pessoas jurídicas de direito privado, sem fins lucrativos, são tradicionalmente instituídas por servidores públicos, “em nome próprio”, sob a forma de fundação, associação ou cooperativa; o objetivo é viabilizar a prestação em caráter privado dos chamados “serviços sociais não exclusivos do Estado”, sendo frequente sua vinculação com entidades da administração direta ou indireta, por meio de convênio (até o início da vigência da Lei Federal nº 13.019/2014).
Ordenamento jurídico
Entre as fundações de apoio e instituições federais de ensino de natureza autárquica, tem-se a incidência da Lei Federal nº 8.958, de 20.12.94, cujo artigo 1º, em sua redação atualizada, permite celebração de convênios e contratos, por prazo determinado, desde que a fundação tenha sido instituída “com a finalidade de apoiar projetos de ensino, pesquisa, extensão, desenvolvimento institucional, científico e tecnológico e estímulo à inovação, inclusive na gestão administrativa e financeira necessária à execução desses projetos”. A Lei nº 13.243, de 11 de janeiro de 2016, por sua vez, deu nova redação à Lei nº 10.973/2004 e no inciso VII do artigo 2º fixou que a fundação de apoio é criada com a finalidade de apoiar projetos de pesquisa, ensino e extensão, projetos de desenvolvimento institucional, científico, tecnológico e projetos de estímulo à inovação de interesse das ICTs, “registrada e credenciada no Ministério da Educação e no Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação, nos termos da Lei nº 8.958, de 20 de dezembro de 1994, e das demais legislações pertinentes nas esferas estadual, distrital e municipal”.
Normatizações sobre as entidades de apoio, como a vigente no âmbito federal a partir da Lei nº 8.958/94, com acréscimos de novos preceitos, são positivas, por serem claros os perigos existentes em razão das relações jurídicas entre Institutos Federais e ICTS e fundações privadas, ainda que “sem fins lucrativos”. Por exemplo, é frequente a superposição de funções dos servidores das autarquias da União que, simultaneamente, exercem funções na entidade privada credenciada e contratada como fundação de apoio. Mesmo quando tal superposição não existe, é comum que se confunda a posição dos agentes nas diferentes pessoas (autarquia federal e entidade de apoio). Estabelecer regras a esse propósito, bem como os limites possíveis aos vínculos firmados é essencial para que se evitem ilicitudes e irregularidades. No que tange a essa realidade, vale colacionar o magistério de Fabrício Motta:
“Há longa data remonta a existência de fundações privadas ligadas por laços fortes às universidades públicas. Tratava-se de fundações instituídas por particulares, geralmente com algum vínculo com a universidade, criadas com o propósito específico de apoiar a realização de suas atividades, especialmente aquelas ligadas ao ensino e à pesquisa. Essas entidades, existentes em maior número na esfera federal e também em alguns Estados, surgiram e foram ganhando importância por materializarem uma possibilidade de diminuir as diversas dificuldades – restrições normativas – impostas pelo ordenamento às universidades públicas, geralmente constituídas como autarquias ou fundações estatais públicas. As relações entre algumas dessas entidades – fundações de apoio e universidades – foram se tornando intrincadas e, talvez, promíscuas em razão da imbricação de interesses e recursos públicos e privados.” [3]
O competente administrativista goiano esclarece que as fundações de apoio não consubstanciam fundações instituídas pelas próprias universidades públicas ou ICTs, mediante a destinação de parte de seu patrimônio. Trata-se de entidade constituída por particulares para apoiar projetos de ensino, pesquisa, extensão, desenvolvimento institucional, científico e tecnológico e estímulo à inovação, inclusive na gestão administrativa e financeira necessária à execução desses projetos (art. 1º da Lei nº 8.958/1994, alterada pela Lei nº 12.863/2013), ao que acrescenta:
“As fundações de apoio não se caracterizam como fundações estatais, por não serem instituídas ou mantidas pelo Estado. Em consequência, essas fundações não compõem a Administração Indireta.
As fundações de apoio, como se disse, são privadas, e mantêm com as universidades vínculos contratuais diversos – contratos e convênios – que podem ser celebrados mediante dispensa de licitação. (…)
O regime jurídico dessas fundações é o mesmo aplicável às fundações de direito privado. Contudo, a partir do momento em que recebem recursos públicos por intermédio de qualquer instrumento essas entidades passam a se submeter às derrogações impostas pelo direito público, sobretudo no tocante ao dever de prestar contas (art. 70, parágrafo único, e 71, II, da CF/1988) e de observar os princípios aplicáveis à Administração Pública.
A professora Maria Sylvia Zanella di Pietro, a respeito da figura jurídica em análise, explica que a Lei Federal n º 8.958/1994 estabelece exigências de controle e de prévio credenciamento junto aos Ministérios da Educação e da Ciência e Tecnologia. Outrossim, a lei federal prevê realização de licitação nas hipóteses que especifica, dever de prestar contas, além de requisitos para a utilização, pela entidade de apoio, de servidores públicos e de bens públicos, neste último caso mediante remuneração. Segundo a ilustre jurista, as fundações de apoio devem ser instituídas como pessoas jurídicas de direito privado, sem fins lucrativos, sendo regidas pelo Código Civil e por estatutos, os quais devem observar os princípios da legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade, economicidade e eficiência. Essas entidades sujeitam-se à fiscalização do Ministério Público, à legislação trabalhista e ao prévio registro e credenciamento no Ministério da Educação e do Desporto e no Ministério da Ciência e Tecnologia, renovável bienalmente. Lembra Maria Sylvia que ICTs “podem autorizar a participação de seus servidores nas atividades realizadas pelas fundações, referidas no art. 1º, sem a criação de vínculo de emprego”, sendo vedada essa contratação para atender a necessidades de caráter permanente das ICTs. Por fim, a autora menciona, ainda, a previsão de “concessão de bolsas de ensino, pesquisa e extensão e de estímulo à inovação, pelas fundações de apoio aos alunos de graduação e pós-graduação, vinculadas a projetos institucionais das Ifes e ICTs”[4].
Cumpre ressaltar que o regramento da Lei nº 8.958/1994 tem incidência no nível federal, enquanto norma organizatória administrativa interna da União. O objetivo desse diploma, do Decreto Federal nº 7.423/2010 e da Portaria Ministerial nº 1.921/2012 MEC/MCTI é explicitar o regime jurídico das relações entre ICTs e IFES (institutos federais de ensino superior) com fundações de apoio, estabelecer requisitos para que ocorra colaboração no âmbito da estrutura administrativa da União, sendo certo que nenhuma consequência jurídica os dispositivos da Lei Federal nº 8.958/94 produzem automaticamente nos demais níveis da federação, em especial no que tange à normatização do regime jurídico de gestão de recursos das entidades administrativas das pessoas públicas. Em outras palavras: o fato de a União entender possível que vínculo com uma fundação de apoio não altera como o Estado ou o Município ou o DF decide, por lei, estruturar seus vínculos e reger a captação, gestão e aplicação dos seus recursos.
Considerando a perspectiva de Estados membros, DF e Municípios normatizarem a atuação da sua estrutura administrativa utilizando-se de vínculo com fundação de apoio para captar, gerir e aplicar recursos próprios da instituição científica e tecnológica, devem ser ressaltados alguns aspectos essenciais.
Lei Federal nº 13.014/2014: um novo modo de estabelecer parcerias
Em primeiro plano, tem-se em vigor desde janeiro de 2016, depois de longo período de “vacatio legis”, a Lei Federal nº 13.019/2014, que instituiu normas gerais para as parcerias entre a administração pública e organizações da sociedade civil, em regime de mútua cooperação, para a consecução de finalidades de interesse público e recíproco, mediante a execução de atividades ou de projetos previamente estabelecidos em planos de trabalho inseridos em termos de colaboração, em termos de fomento ou em acordos de cooperação (artigo 1º).
O referido diploma legal, que veicula normas gerais de acordos de cooperação firmados entre Administração Pública e organizações da sociedade civil, restringiu os convênios, regidos pelo artigo 116 da Lei Federal nº 8.666/93, àqueles celebrados “entre entes federados ou pessoas jurídicas a ele vinculadas” e aos “decorrentes da aplicação do disposto no inciso IV do art. 3º” (artigo 84, parágrafo único, I e II). O citado artigo 3º IV refere-se aos convênios e contratos celebrados com entidades filantrópicas e sem fins lucrativos de que trata a Constituição da República no artigo 199, §1º, “in verbis”:
Art. 199 (…) §1º As instituições privadas poderão participar de forma complementar do sistema único de saúde, segundo diretrizes deste, mediante contrato de direito público ou convênio, tendo preferência as entidades filantrópicas e as sem fins lucrativos.
Excluída a hipótese de convênio entre pessoas federativas e entidades da sua Administração indireta, bem como convênios e contratos firmados com entidades filantrópicas do sistema complementar do SUS, trata-se de hipótese sujeita à Lei Federal nº 13.019, destacando-se os seguintes preceitos:
“Art. 2o Para os fins desta Lei, considera-se: (…)
VII – termo de colaboração: instrumento por meio do qual são formalizadas as parcerias estabelecidas pela administração pública com organizações da sociedade civil para a consecução de finalidades de interesse público e recíproco propostas pela administração pública que envolvam a transferência de recursos financeiros
VIII – termo de fomento: instrumento por meio do qual são formalizadas as parcerias estabelecidas pela administração pública com organizações da sociedade civil para a consecução de finalidades de interesse público e recíproco propostas pelas organizações da sociedade civil, que envolvam a transferência de recursos financeiros;
VIII-A – acordo de cooperação: instrumento por meio do qual são formalizadas as parcerias estabelecidas pela administração pública com organizações da sociedade civil para a consecução de finalidades de interesse público e recíproco que não envolvam a transferência de recursos financeiros
XII – chamamento público: procedimento destinado a selecionar organização da sociedade civil para firmar parceria por meio de termo de colaboração ou de fomento, no qual se garanta a observância dos princípios da isonomia, da legalidade, da impessoalidade, da moralidade, da igualdade, da publicidade, da probidade administrativa, da vinculação ao instrumento convocatório, do julgamento objetivo e dos que lhes são correlatos;
Art. 23. A administração pública deverá adotar procedimentos claros, objetivos e simplificados que orientem os interessados e facilitem o acesso direto aos seus órgãos e instâncias decisórias, independentemente da modalidade de parceria prevista nesta Lei.
Art. 24. Exceto nas hipóteses previstas nesta Lei, a celebração de termo de colaboração ou de fomento será precedida de chamamento público voltado a selecionar organizações da sociedade civil que tornem mais eficaz a execução do objeto.
Art. 29. Os termos de colaboração ou de fomento que envolvam recursos decorrentes de emendas parlamentares às leis orçamentárias anuais e os acordos de cooperação serão celebrados sem chamamento público, exceto, em relação aos acordos de cooperação, quando o objeto envolver a celebração de comodato, doação de bens ou outra forma de compartilhamento de recurso patrimonial, hipótese em que o respectivo chamamento público observará o disposto nesta Lei.
Art. 30. A administração pública poderá dispensar a realização do chamamento público:
I – no caso de urgência decorrente de paralisação ou iminência de paralisação de atividades de relevante interesse público, pelo prazo de até cento e oitenta dias;
II – nos casos de guerra, calamidade pública, grave perturbação da ordem pública ou ameaça à paz social;
III – quando se tratar da realização de programa de proteção a pessoas ameaçadas ou em situação que possa comprometer a sua segurança;
IV – (vetado).
V – (vetado)
VI – no caso de atividades voltadas ou vinculadas a serviços de educação, saúde e assistência social, desde que executadas por organizações da sociedade civil previamente credenciadas pelo órgão gestor da respectiva política.
Art. 31. Será considerado inexigível o chamamento público na hipótese de inviabilidade de competição entre as organizações da sociedade civil, em razão da natureza singular do objeto da parceria ou se as metas somente puderem ser atingidas por uma entidade específica, especialmente quando:
I – o objeto da parceria constituir incumbência prevista em acordo, ato ou compromisso internacional, no qual sejam indicadas as instituições que utilizarão os recursos;
II – a parceria decorrer de transferência para organização da sociedade civil que esteja autorizada em lei na qual seja identificada expressamente a entidade beneficiária, inclusive quando se tratar da subvenção prevista no inciso I do §3º do art. 12 da Lei no 4.320, de 17 de março de 1964, observado o disposto no art. 26 da Lei Complementar no 101, de 4 de maio de 2000.
Art. 42. As parcerias serão formalizadas mediante a celebração de termo de colaboração, de termo de fomento ou de acordo de cooperação, conforme o caso, que terá como cláusulas essenciais:
(…) XIX – a responsabilidade exclusiva da organização da sociedade civil pelo gerenciamento administrativo e financeiro dos recursos recebidos, inclusive no que diz respeito às despesas de custeio, de investimento e de pessoal;
XX – a responsabilidade exclusiva da organização da sociedade civil pelo pagamento dos encargos trabalhistas, previdenciários, fiscais e comerciais relacionados à execução do objeto previsto no termo de colaboração ou de fomento, não implicando responsabilidade solidária ou subsidiária da administração pública a inadimplência da organização da sociedade civil em relação ao referido pagamento, os ônus incidentes sobre o objeto da parceria ou os danos decorrentes de restrição à sua execução.
Art. 45. As despesas relacionadas à execução da parceria serão executadas nos termos dos incisos XIX e XX do art. 42, sendo vedado:
I – utilizar recursos para finalidade alheia ao objeto da parceria;
II – pagar, a qualquer título, servidor ou empregado público com recursos vinculados à parceria, salvo nas hipóteses previstas em lei específica e na lei de diretrizes orçamentárias;
Art. 51. Os recursos recebidos em decorrência da parceria serão depositados em conta corrente específica isenta de tarifa bancária na instituição financeira pública determinada pela administração pública.
Parágrafo único. Os rendimentos de ativos financeiros serão aplicados no objeto da parceria, estando sujeitos às mesmas condições de prestação de contas exigidas para os recursos transferidos.
Art. 52. Por ocasião da conclusão, denúncia, rescisão ou extinção da parceria, os saldos financeiros remanescentes, inclusive os provenientes das receitas obtidas das aplicações financeiras realizadas, serão devolvidos à administração pública no prazo improrrogável de trinta dias, sob pena de imediata instauração de tomada de contas especial do responsável, providenciada pela autoridade competente da administração pública.
Art. 53. Toda a movimentação de recursos no âmbito da parceria será realizada mediante transferência eletrônica sujeita à identificação do beneficiário final e à obrigatoriedade de depósito em sua conta bancária.
- 1o Os pagamentos deverão ser realizados mediante crédito na conta bancária de titularidade dos fornecedores e prestadores de serviços.
- 2o Demonstrada a impossibilidade física de pagamento mediante transferência eletrônica, o termo de colaboração ou de fomento poderá admitir a realização de pagamentos em espécie.”
A vigência anterior do artigo 24, XIII da Lei Federal nº 8.666/93
Observe-se que antes de entrar em vigor a Lei Federal nº 13.019/14, com um novo sistema de acordos entre Administração Pública e organizações da sociedade civil, estava à disposição a possibilidade de firmar com fundações de apoio convênio ou contrato, conforme fossem os interesses convergentes ou não, valendo-se do artigo 24, XIII da Lei Federal nº 8.666/93, a saber, norma geral veiculadora de hipótese de contratação direta de instituição sem fins lucrativos. O citado dispositivo do Estatuto das Licitações somente estabelece como dispensável a licitação realizada com o objetivo de contratar “instituição brasileira incumbida regimental ou estatutariamente da pesquisa, do ensino ou do desenvolvimento institucional (…) desde que a contratada detenha inquestionável reputação ético-profissional e não tenha fins lucrativos”. À obviedade, prever como hipótese de dispensa de licitação uma situação administrativa não implica a modernização de todo um setor, como o que pretendeu a Lei Federal nº 13.243/2016, nem o estabelecimento de normas gerais de parcerias com organizações da sociedade civil, como as veiculadas na Lei Federal nº 13.019/2014 (incidentes em todas as pessoas federativas).
Na verdade, decorre do inciso XIII do artigo 24 da Lei Federal nº 8.666/93 somente permissão para dispensa de licitação em duas situações: a) contratação direta de pessoas jurídicas privadas ou públicas que se destinem, conforme regimento ou estatuto, à pesquisa, ao ensino ou ao desenvolvimento institucional; e b) contratação direta de entidade dedicada à recuperação social do preso. Em ambas as situações é necessário que a pessoa jurídica a ser contratada possua inquestionável reputação ético-profissional e não tenha fins lucrativos. O inciso XIII do artigo 24 reza que a entidade deverá possuir forma civil e ser brasileira, ou seja, instituída e criada sob a lei brasileira. Sua natureza jurídica pode ser de direito público ou privado, sendo necessário que não tenha fins lucrativos, o que traz implícito caráter social, sendo tais caracteres presentes nas fundações de apoio existentes no país.
Para fazer jus ao enquadramento no inciso XIII do artigo 24 da Lei Federal nº 8.666/93, as entidades não podem ter fins lucrativos (não podem visar lucro) e, segundo a doutrina, devem ostentar inquestionável reputação ético-profissional (não podem haver fatos que maculem o bom nome dela[5], sendo certo que:
“Uma das características que mais chama a atenção neste dispositivo legal é a referência que a instituição contratada não tenha fins lucrativos, mas sim sociais, além da inquestionável exigência de sua reputação ético-profissional, caso contrário não estaria ela apta a contratar com a Administração Pública nem a cumprir os princípios que norteiam seus contratos.”[6]
Além desses aspectos e embora a lei expressamente não o exija, entendeu-se necessário buscar uma correlação entre as instituições e o objeto do futuro contrato, voltando-se para ações de pesquisa, ensino e desenvolvimento educacional, de modo que não se permita execução indireta de serviços de baixa complexidade ou terceirização. Em mais de uma oportunidade também se reconheceu como ilícitos os chamados “contratos “guarda-chuva” que não indicam precisamente os objetos contratos com as fundações de apoio, nem mesmo a conexão com a atividade de desenvolvimento institucional específica. O TCU, na Decisão nº 219/00, prolatada pela 2ª Câmara, já entendeu que a despeito de uma Fundação Pública (Universidade de Brasília), como instituição pública voltada ao ensino superior e à pesquisa, com inquestionável reputação ético-profissional, possuir os requisitos para ser eventualmente contratada nos termos do artigo 24, XIII da Lei de Licitações em vigor, “o contrato em tela não poderia incluir, em seu objeto, a prestação indireta de serviços de recepção e atendimento ao público, por se tratar de atividade que não se vincula aos requisitos legais exigidos à contratada.”[7] No âmbito federal, destaca-se a Orientação Normativa AGU Nº 14, de 01 abril de 2009:
“OS CONTRATOS FIRMADOS COM AS FUNDAÇÕES DE APOIO COM BASE NA DISPENSA DE LICITAÇÃO PREVISTA NO INC. XIII DO ART. 24 DA LEI Nº 8.666, DE 1993, DEVEM ESTAR DIRETAMENTE VINCULADOS A PROJETOS COM DEFINIÇÃO CLARA DO OBJETO E COM PRAZO DETERMINADO, SENDO VEDADAS A SUBCONTRATAÇÃO; A CONTRATAÇÃO DE SERVIÇOS CONTÍNUOS OU DE MANUTENÇÃO; E A CONTRATAÇÃO DE SERVIÇOS DESTINADOS A ATENDER AS NECESSIDADES PERMANENTES DA INSTITUIÇÃO.”
Não foi em sentido diverso o enunciado da Súmula 250 do TCU:
“A contratação de instituição sem fins lucrativos, com dispensa de licitação, com fulcro no art. 24, inciso XIII, da Lei n.º 8.666/93, somente é admitida nas hipóteses em que houver nexo efetivo entre o mencionado dispositivo, a natureza da instituição e o objeto contratado, além de comprovada a compatibilidade com os preços de mercado.”
Sobre a incidência do referido dispositivo da Lei nº 8.666 em todas as pessoas federativas, observe-se a lição de Ronny Charles ao escrever que, além do nível federal, já se “consolidou o entendimento de que outros órgãos da Administração possuem também essa prerrogativa” de contratação direta.[8] Tal conclusão, irrepreensível, em razão da própria natureza de norma geral do inciso XIII do artigo 24 da Lei Federal nº 8.666/93, ensejou que em todos os níveis da federação fossem contratadas fundações de apoio nos termos dos requisitos do Estatuto das Licitações, com atenção à reputação ético-profissional da entidade, à pertinência do objeto contratado com as finalidades e competências legais da fundação, à capacidade de a entidade executar, com sua própria estrutura e de acordo com suas competências, o objeto do contrato, sem qualquer necessidade de subcontratação. Destaca-se a avaliação, em cada caso, de conveniência, ou não, em licitar em face das alternativas existentes no mercado: a fundação de apoio sendo a melhor forma de atender as peculiaridades administrativas, legítimo o juízo técnico positivo de conveniência quanto à contratação direta (competência discricionária a ser exercida pela autoridade ou órgão competente, com posterior redução à escrito mediante a indispensável motivação); caso contrário, inviável firmar o vínculo.
Em mais de uma oportunidade, reiterou-se ser fundamental o exame, em cada caso concreto, da presença, ou não dos requisitos legais autorizadores, ou não, da contratação direta, sendo necessário avaliar as diversas peculiaridades de que pode se revestir a realidade administrativa a ser enquadrada no inciso XIII do artigo 24 da Lei Federal nº 8.666/93. Não se ignorou a indispensabilidade do cumprimento das exigências procedimentais inerentes às contratações direta, conforme normas gerais federais em vigor.
Desafios na edição de normas legais e regulamentares supervenientes
Tais aspectos, analisados quando da aplicação da mera autorização para contratação direta de instituições brasileiras que atuam na área de pesquisa, do ensino ou do desenvolvimento institucional, devem ser considerados quando do exame de novos modos de atuação para entidades administrativas das pessoas administrativas, evitando que vínculos de cooperação com entidades como fundações de apoio terminem por ofender regras de contratação em vigor ou por instituir cenário de significativos riscos ao interesse público primário. Deve ser considerada a advertência de entidades administrativas não firmarem parcerias que, no lugar da convergência de esforços, terminem por implantar terceirização ilícita, sendo necessário evitar o deslocamento de atividades típicas das instituições científicas e tecnológicas para o setor das entidades de apoio, excluídas de normas administrativas como o dever de licitar e de gerir recursos segundo normas gerais de direito administrativo e financeiro editadas pela União. Embora seja clara a demanda imediata por aprimoramento e modernização dos mecanismos de atuação na Administração Pública, não se pode ignorar a vedação a que qualquer instituto sirva para mera contratação indireta de pessoal, o que é proibido também em face da fundação de apoio. É necessário usar o instrumento de parceria adequado, conforme a ordem jurídica agora vigente, e afastar qualquer contratação em que uma entidade de apoio sirva como mera intermediária entre uma entidade da Administração Indireta e qualquer terceiro, excluindo restrições das contratações administrativas e de admissão de pessoal.
Especificamente quanto às receitas, é certo que, mesmo em se admitindo em cada nível federativo a sua arrecadação pela própria fundação de apoio, cautelas fundamentais deverão ser observadas quanto ao recolhimento, de modo a permitir atividade de controle, inclusive quando a eventual reserva e uso adequado dos valores obtidos.
O objetivo a ser mensurado é a viabilidade de alteração legislativa em cada ente federativo ensejar o efetivo aprimoramento de entidade administrativa e levar a uma maior efetividade das suas atividades. Isso, sem colocar em risco a gestão responsável e lícita dos recursos públicos, nem instituir um ambiente normativo que, na prática poderá favorecer irregularidades, desvios e até desperdícios de recursos essenciais à sociedade. Para tanto, recomenda-se que sejam fixados preceitos que, muito além de reiterar normas editadas pela União):
a) conduzam à análise adequada da documentação relativa aos acordos de parceria que serão firmados;
b) ensejem o acompanhamento e avaliação da execução dos projetos realizados em parceria com as fundações de apoio, com previsão específica de fiscais com competência de controle obrigatório;
c) garantam a observância das exigências procedimentais preliminares, simultânea e posteriores à realização do objeto avençado;
d) definam recursos públicos de modo a evitar desvio de recursos financeiros, materiais e até pessoais ao fundamento de que se trata de “recursos próprios do projeto”, bem como estabeleçam meios de se ultimar controle contábil individualizado nos projetos desenvolvidos;
e) excluam a mera terceirização irregular das atividades exclusivas de pessoas públicas, tais como autarquias, fundações públicas de dirieto público ou a própria Administração direta dos entes ederativos;
f) consagrem mecanismos seguros de arquivamento e publicidade dos dados e informações sobre o vínculo firmado entre a Administração Pública que atua na área de desenvolvimento tecnológico e as fundações de apoio parceiras;
g) exijam elaboração prévia de planos de trabalho, que permitam individualização precisa do objeto, fixação de indicadores de desempenho que permitam controle de resultados, planilhas específicas de custos a discriminar valores e beneficiários a serem identificados individualmente;
h) excluam a subcontratação total ou de parcelas relevantes da parceria firmada entre a Administração Pública do Estado e as fundações de apoio;
i) observem a segregação de funções entre quem planeja a parceria e quem fiscaliza a execução do acordo firmado, devendo o controle incidir sobre aspectos formais de contabilidade e, também, meritórios de economicidade e atingimento dos resultados buscados em cada ajuste;
j) fixem a necessidade de se estabelecer, em cada parceria, prazos de execução e prazos para fiscalização, inclusive análise das prestações de contas, com determinação de consequências jurídicas para a não desvios, inadimplências ou não aprovação das contas prestadas.
Esses aspectos devem ser ponderados quando da edição da lei e de regulamento em cada nível federativo, a fim de que perseguir o dinamismo essencial quando se busca novas tecnologias não signifique um cenário permissivo de ilicitudes. Modernizar com segurança é o desafio que atingirá o legislador e administrador público nessa matéria, com respeito aos limites principiológicos e demandas por efetividade em benefício real da sociedade.
[1] GAROFANO, Rafael. R. Os contratos de parceria na perspectiva da Administração consensual: para uma (necessária) reformulação na teoria dos contratos administrativos. Revista de direito administrativo contemporâneo. Ano 1. São Paulo: Revista dos Tribunais, p. 328, jul-ago 2013.
[2] GAROFANO, Rafael. R. Os contratos de parceria na perspectiva da Administração consensual: para uma (necessária) reformulação na teoria dos contratos administrativos. Revista de direito administrativo contemporâneo, op. cit., p. 298-299.
[3] MOTTA, Fabrício. Fundações. In Administração Pública e servidores públicos. v. II. PIETRO, Maria Sylvia Zanella di e MOTTA, Fabrício. Coord. 2014. São Paulo: Revista dos Tribunais, p. 200.
[4] PIETRO, Maria Sylvia Zanella di. Entidades ParaEstatais e Terceiro Setor. In Administração Pública e servidores públicos. v. II. PIETRO, Maria Sylvia Zanella di e MOTTA, Fabrício. Coord. 2014. São Paulo: Revista dos Tribunais, p. 285- 286.
[5] NIEBUHR, Joel de Menezes. Dispensa e Inexigibilidade de Licitação Pública. São Paulo: Dialética, 2003, p. 315.
[6] MADEIRA, José Maria Pinheiro e MADEIRA, Jansen Amadeu do Carmo. Dispensa de licitação às entidades sem fins lucrativos. Fórum de Contratação e Gestão Pública, Belo Horizonte, Fórum, a. 7, n. 82, out. 2008. p. 63.
[7] Boletim de Licitação e Contratos, nov./2000, p. 598.
[8] CHARLES, Ronny. Leis de Licitações Públicas Comentadas, op. cit, p. 119.