Políticas públicas: do profano ao sagrado; do carnaval à quaresma

Tempo de leitura: 22 minutos

 

1.Preparando o furdunço

Falar sobre festas profanas como a folia momesca ou fazer referência a qualquer assunto que margeie questão religiosa não costuma trazer bons frutos em publicação de qualquer natureza. No entanto, resolvi arriscar. Primeiro porque já se passou mais de um ano de convívio no “Direito Administrativo para Todos”, com diversos artigos que permitem entender os valores que embasam as convicções pessoais, sendo o tom firme, múltiplo e respeitoso claramente perceptível também em aulas publicizadas gratuitamente em redes sociais. Além disso, falar de temas difíceis costuma ser produtivo e indispensável, sendo intolerável silêncio de quem se pretende professor de verdade. Logo, vamos lá. Vou falar de carnaval. E de religião. “Recebam essa galinha pulando”, como se diz em parte do nordeste.

 

2. A folia e o seu recado

No mês de janeiro, tive a oportunidade de comparecer a uma festa profano-religiosa. Na Bahia, vi a mistura do melhor da música, inclusive do samba carioca, com muito da fé cristã surgindo pelas mãos da Irmandade da Boa Morte, em procissão no meio de centenas de foliões emocionados a cantar para homenagear o menino Jesus. Demorei dias para processar a surpresa com as cores, os sons, a energia, as lágrimas, o canto, as orações, a dança e a alegria que, juntos, éramos o Brasil. Agradeci a Salvador e em especial a Carlinhos Brown por conseguirem, em pleno Mercado do Ouro – lugar do comércio de negros no passado – fazer uma festa que trouxe um pouco de esperança a um coração por formação comprometido com a diversidade e, por decepção, descrente nesse mundo cada vez mais desrespeitoso com as diferenças e capaz de trair os mais nobres vínculos.

Pois não aconteceria em outro lugar que não a Bahia: um restinho da fagulha desistiu de apagar, mesmo diante dos mares de lama que insistem em sair destruindo o que encontram pela frente. É verdade que a maldade existe. Vem pela omissão, pelo cinismo de permanecer assentado nos respeitosos minutos de silêncio, pela covardia de quem tem competência para proteger quem precisa e não o faz, pela vaidade e arrogância de se ver prevalecer a qualquer custo e pelas formas mais surpreendentes possíveis. E não. O “bem não vence o mal”. Aliás, ao contrário, o mal vence e muito mais vezes do que pensamos aguentar. No entanto, aguentamos. E melhor: resistimos.

Resistimos pelo propósito que nos move. Aquele que nos significa individual e coletivamente. Resistimos ainda quando esmigalhados em vale de lama ou de perversão sistêmica. E resistir, nesse contexto, significa muito além de sobreviver silenciosamente, suportando as dores resignadamente. Trata-se de outra coisa. Penso na sabedoria de passar pelo injusto e pelo absurdo com dignidade. Refiro-me à possibilidade de amparo entre semelhantes e, juntos, até arriscarmos alguns passos. Falo de assegurar, principalmente, voz. Porque não há resistência verdadeira no sacrifício mudo e estoico. Só há dignidade se, vivendo o inevitável, lembrarmos que “paz sem voz, não é paz; é medo”.

Nos últimos cinco dias, fiquei a pensar o quanto da nossa voz terminou sendo foliã. Apesar de tudo, há algo que ainda pulsa e escoa nas multidões que brincam carnaval país afora. Em Belo Horizonte, milhares de pessoas em silêncio homenagearam as vítimas de Brumadinho. Aliás, inúmeros foram os blocos em que aconteceram manifestações de inconformismos, muitos ensurdecidos nos últimos tempos e que, de repente, em meio a marchinhas e fantasias, saíram do armário para ganhar as ruas de tantas cidades.

Não, o país não mudou em cinco dias. Sim, seguimos estranhamente rachados, muito raivosos e afundados numa grave crise. O que a irreverência da folia deixou claro é que a cegueira do Saramago não é epidemia para um bocado de gente. Um pessoal que cantou, dançou, pulou e se divertiu um colosso, enquanto dizia. Dizia de si, do país e até do mundo. Com a lucidez de quem vê e escolhe viver. Muitos, rodeados de alegria sincera, partilhada com gente querida e verdadeira. Infelizmente, teve quem se deparasse com a violência: essa que anda nas ruas homofóbicas e racistas, a que explode no trânsito e na vida. Ainda assim, um tanto bom das vítimas conseguiu dar meia volta e rodopiar mais um tiquinho, desafiando o horror com mais alegria. Esse tipo de reação que faz dobrar a raiva de quem não sorri nunca e ainda dissemina o pior quanto a tudo. Paciência. Tem muita “mosca que só sabe pousar no podre da maçã” por aí. Não há de se falar disso. O foco é comemorar a voz foliã que soube o que dizer.

Então quero falar do samba enredo da Mangueira, escola de samba campeã do carnaval carioca de 2019:

“Mangueira, tira a poeira dos porões

Ô, abre alas pros teus heróis de barracões

Dos Brasis que se faz um país de Lecis, jamelões

São verde e rosa, as multidões (…)

Brasil, meu nego

Deixa eu te contar

A história que a história não conta

O avesso do mesmo lugar

Na luta é que a gente se encontra

Brasil, meu dengo

A Mangueira chegou

Com versos que o livro apagou

Desde 1500 tem mais invasão do que descobrimento

Tem sangue retinto pisado

Atrás do herói emoldurado

Mulheres, tamoios, mulatos

Eu quero um país que não está no retrato

Brasil, o teu nome é Dandara

E a tua cara é de cariri

Não veio do céu

Nem das mãos de Isabel

A liberdade é um dragão no mar de Aracati

Salve os caboclos de julho

Quem foi de aço nos anos de chumbo

Brasil, chegou a vez

De ouvir as Marias, Mahins, Marielles, malês”.

Foi do samba que veio a lembrança que é um chamado para quem estuda e trabalha com o Direito: é preciso atentar para o que não está escrito e para quem não teve nem tem voz. O nosso instrumento de trabalho é uma ciência historicamente serva do Poder vigente, com todos os seus abusos e violências. A captura das normas em favor de valores estranhos à justiça, à inclusão social, ao crescimento e evolução dos cidadãos é tradição jurídica. É preciso estar disposto, todos os dias, a tirar dos porões quem massacramos para longe do sistema que permanece a serviço de interesses econômicos e políticos supremos. Assegurar visibilidade a quem não está no retrato do Direito, ouvir Marias e Marielles apagadas do sistema para não ameaçar seus pactos escusos, insistir em reconhecer os heróis de fato, redescobrindo o avesso que é o Direito e que vem das multidões, livre como conquista e não como presente da lei ou do céu.

Ao fim da quarta-feira, com as cinzas do carnaval convocando para arregaçarmos as mangas em direção ao “país que não está no retrato”, chegou a vez do encontro e de dar um nome à luta. Cá de mim, peço emprestada a campanha da fraternidade. Passamos então à quaresma.

 

3. “Fraternidade e políticas públicas”

Além de deixar clara a paixão pela folia carnavalesca, confesso a formação religiosa pessoal engajada em um cotidiano de ações sociais. Em vez de simples leituras formais de textos bíblicos, D. Therezinha (minha mãe) tinha o cuidado de ler notícias de jornais e discutir com as crianças, e depois adolescentes, o que significavam máximas como “amar ao próximo como a si mesmo”. “Religião da boca pra fora não resolve nada!”. “Deus é um só, os caminhos para chegar até Ele é que podem ser diferentes.” “A gente pode caminhar junto de quem pensa diferente!” “Rezar o pai nosso e tratar mau o lixeiro é pior do que ser ateu!” Em meio àquela profusão de valores, terminamos a juventude refletindo como relacionar melhor com quem convivíamos e como respeitar quem trabalhava em casa e na escola, ajudando em creches e asilos da cidade, subindo favelas, integrando associações da comunidade e fazendo realidade a ideia de participação social.

Reconheço, portanto, que ver o tema das políticas públicas ganhar a campanha da Fraternidade representa um espaço de conforto, ainda mais quando são defendidas ações e programas desenvolvidos pelo Estado para garantir e colocar em prática direitos que são previstos na Constituição Federal e em outras leis:

“Ou seja, o governo, as instituições e os indivíduos da sociedade precisam estar articulados para que os direitos garantidos por lei sejam de fato os direitos de todos, não só de alguns.

Deveria fazer parte do cotidiano do povo acompanhar essas articulações. Não podemos simplesmente delegar isso a alguns e lavar as mãos. Precisamos participar, pois nossa participação é sementeira produtiva para que sempre nasça e cresça para todos o bem comum.

(…) Constituição Federal de 1988 possibilitou introduzir no panorama político brasileiro o que está afirmado no parágrafo único do artigo 1º: “todo poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente”, de modo que foram criados mecanismos para o exercício de uma democracia direta, tais como os plebiscitos, os referendos e os projetos de lei de iniciativa popular. Possibilitou, ainda, que a gestão das políticas ligadas à seguridade social fosse descentralizada e tivesse a participação direta da sociedade civil (artigos 194, 198, 204, 206 e 227).

Compreender melhor o papel e o sentido das políticas públicas, despertar a consciência e incentivar a participação de todo cidadão na construção dessas ações em âmbito nacional, estadual e municipal constitui um dos objetivos específicos desta CF, bem como propor políticas que assegurem os direitos sociais dos mais frágeis e vulneráveis, trabalhando para que as políticas públicas eficazes de governo se consolidem como políticas de Estado. (…)

A democracia parece passar por uma noite escura paradoxal: por um lado, há descrença nos líderes; por outro, existe o desejo de envolvimento nos processos participativos – apesar de que, na maioria das vezes, os que querem se envolver não o fazem.

É preciso lançar luzes sobre esse processo por meio do envolvimento, da participação, do sentir-se corresponsável da luta pelos direitos. Cabe recordar que, se alguns passam situações difíceis por causa das chamadas crises, existem tantos mais vulneráveis que possuem menos ou não possuem nada. Em tempos difíceis, não podemos nos esquecer dos pobres. Por eles vale a pena cada processo que visa à participação em função do bem comum. (…)

A elaboração das políticas públicas nasce de um desejo sincero de dialogar. Todos os homens e mulheres são candidatos e autorizados ao diálogo; neste, todos são bem-vindos: indivíduos, organizações, instituições públicas e privadas. O diálogo desses grupos sempre deve visar ao bem comum de todos, e o direito a tudo aquilo que envolve o bem comum já está garantido na Constituição.

Esse caminho deve ser concreto, partindo sempre da realidade, dos dados, dos fatos para, com base neles, em conjunto, tentar responder às perguntas: O que podemos fazer juntos? Como vamos fazer? O que a lei já nos garante? Com isso temos um panorama das situações, e a partir daí vai se desenhando um caminho.

Por fim, com base em todas as informações do processo de formulação das políticas públicas, tem-se então a estrutura desenhada e a política pública formulada. Como exemplos, podemos citar o Sistema Único de Saúde (SUS), o Sistema Único de Assistência Social (SUAS), o Sistema Nacional da Juventude (SNJ), o Sistema Nacional dos Direitos Humanos etc.

Uma vez que a política pública é desenhada e implementada, precisa estar em constante avaliação. Sem avaliação, tem-se a tendência de fazer as mesmas coisas sempre do mesmo jeito, e isso não ajuda a avançar. A avaliação ajuda a perceber o que é positivo e o que não é e abre novas vias para novos processos. E o mais importante: isso sempre deve ser feito em constante diálogo entre todas as partes. Vale reforçar que a elaboração das políticas públicas é um esforço conjunto (…)

O papa Francisco, ao falar da dimensão social da evangelização, insiste no diálogo como caminho concreto para alcançar o bem comum:

A evangelização implica também um caminho de diálogo. Neste momento, existem sobretudo três campos de diálogo onde a Igreja deve estar presente, cumprindo um serviço a favor do pleno desenvolvimento do ser humano e procurando o bem comum: o diálogo com os Estados, com a sociedade – que inclui o diálogo com as culturas e as ciências – e com os outros crentes que não fazem parte da Igreja católica.”[1]

As ideias apresentadas não divergem de muitas premissas do conceito de política pública no âmbito do direito, visto que também nessa seara é preciso definir para onde se quer levar a sociedade com participação dos cidadãos, de modo que se alcance justiça social por um lado e, por outro, seja possível auxiliar a continuidade do desenvolvimento, com adoção de políticas educacionais, de redução das desigualdades, ambientais, dentre outras.

3.1. Discutindo sobre políticas públicas no âmbito do Direito Administrativo

Em interessante obra sobre o Direito Administrativo e as políticas públicas, Maria Paula Dallari Bucci aduz que as políticas públicas são instrumentos de ação dos governos em cuja definição tem-se a escolha dos meios para a realização dos objetivos públicos, com a participação do Estado e de particulares: “As políticas públicas devem ser vistas também como processo ou conjunto de processos que culmina na escolha racional e coletiva de prioridades, para a definição dos interesses públicos reconhecidos pelo direito.”[2]

O conceito de políticas públicas ganha relevo para a Ciência do Direito precisamente no estudo da efetivação dos direitos constitucionais sociais, também chamados direitos fundamentais de segunda e terceira dimensões.[3] Atualmente, com o pluralismo social, mostra-se premente a análise jurídica das políticas públicas. Considerando que significam a coordenação dos meios à disposição do Estado, de forma a harmonizar as atividades estatais e privadas para a realização de objetivos socialmente relevantes e politicamente determinados, o seu estudo deve se dar também no âmbito do Direito Administrativo.[4] Nesse estudo, surgiram recentemente referências a “políticas de Estado” em lugar de políticas públicas ou governamentais. Elas teriam caráter particularmente estável e inflexível e obrigariam todos os governos de um Estado em particular a implementá-las, independentemente dos mandatos que os eleitores lhes confiassem, em momentos históricos distintos. Na prática a noção de política de Estado difere pouco do conceito de política pública, pois se limita aos valores consagrados na Constituição. Afinal, governos democráticos não disputam princípios constitucionais, que se presumem universais, simplesmente, cumprem-nos.[5]

Sobre a necessidade de se compreender adequadamente a ideia de política pública como algo que remete para a esfera do público e dos seus problemas, distinguindo-se, por um lado, do privado, do indivíduo, do particular e de sua intimidade e, por outro lado, do estatal. Trata-se de uma dimensão mais ampla, que se desdobra em estatal e não-estatal. “O Estado está voltado (deve estar) inteiramente ao que é público, mas há igualmente instâncias e organizações da sociedade que possuem finalidades públicas expressas, as quais cabe a denominação públicas não-estatais.”[6]  Nessa nova perspectiva, não se pode negar ser fundamental uma maior participação dos cidadãos na deliberação para tomada de decisões, principalmente em nível local e regional, além de uma crescente participação na gestão dessas políticas públicas, levadas a cabo por uma grande plêiade de atores sociais. A esfera pública acaba sendo, ou deveria assim ser, aberta ao livre fluxo de argumentos, influenciando a Administração, e, assim, evitando a autoprogramação. A Administração legitimada abre-se à participação social, compartilhando a gestão do interesse público.[7]

Há países que preveem, em seus ordenamentos, a possibilidade da participação direta dos cidadãos em alguns casos (população decide através de órgãos de associação, sindicatos, assembleias livres em que cada um tem direito a voto). Posteriormente, essas decisões são condensadas, pelo Executivo, no planejamento geral dos investimentos públicos. Em países como o Brasil e em outros, a definição das políticas públicas pouco tem da interferência das populações para as quais são destinadas as prestações proporcionadas pelos planos estatais de governo. Costuma ficar sob a responsabilidade do Executivo, que acaba por ceder apenas em alguns setores, conforme o nível de pressão dos atores sociais, e do Legislativo, responsável por algumas mudanças provocadas, igualmente pela interferência de grupos de pressão, e boa parte fruto de negociações políticas, não raro, distanciadas das verdadeiras expectativas das populações. O resultado é a definição de políticas públicas ineficientes – cuja realização causa graves danos ao erário e aos cidadãos – e até imorais, quando resultam de acordos para atender interesses políticos, pessoais ou de grupos que compõem as instâncias de decisão sobre tais questões no âmbito do Parlamento e da Administração.[8]

Deve-se atentar para o fato de que qualquer tentativa de reconstrução deve estar assentada em um mínimo de consenso entre a sociedade e alguns setores básicos da Administração. Legisladores, administradores e juristas por vezes ignoram a necessidade de cumplicidade com uma sociedade anteriormente preparada, concentrando-se em realizar ajustes formalistas, sem atacar algumas das principais causas da ineficiência das políticas públicas.

Nesse contexto, assumir a responsabilidade da sociedade civil é indispensável e não apenas no momento da eleição, mas no exercício de poder nas esferas de participação procedimental consagradas em determinadas searas como também no controle da implantação das políticas de Estado, de modo a que se tenha a concreção dos direitos fundamentais previstos na Constituição. Fala-se, aqui, do direito de participação do cidadão que deve ser alargado, exigência que chega ao Direito Administrativo, o qual é, também, o direito processual da Constituição:

“Logo, a participação do cidadão seja na formulação ou auxílio à definição de prioridades públicas, seja no controle social dos órgãos e das atuações dos agentes públicos, é imprescindível para a ‘estabilização do sistema’, pois o cidadão também é um dos intérpretes da Constituição, não somente o legislador, não somente o juiz, não somente o Administrador Público. Avançando na idéia, talvez o intérprete mais ‘autêntico’ do que seja interesse público seja o cidadão.

O Direito Administrativo, renovado, tendo a pessoa humana com sua irrenunciável dignidade como seu foco, deve contribuir para a democratização da democracia, como reclama Canotilho.”[9]

É sob esse prisma que se defende uma participação social viabilizada não só por meio de avaliações de qualidade e controle “a posteriori”, mas pela própria integração dos cidadãos em órgãos colegiados decisórios. Afinal, a legitimidade se constrói pelos procedimentos de composição das instituições, por sua atuação concreta e pela fiscalização exercida sobre elas. Nesse sentido, a legitimidade surge como um atributo que reside na confluência entre as características da formação das instâncias de decisão, das funções assumidas e exercidas, bem como no controle realizado. Entende-se ser um significativo desafio superar a falta de tradição da população quando se trata de participar, atuar e controlar estruturas que concebem e implementam políticas de Estado. Malgrado tais dificuldades, não há dúvida sobre o quanto é essencial assumir o referido espaço no momento presente do Brasil.

Não há que se admitir o enfraquecimento dos princípios de participação democrática e igualdade nos processos decisórios, nem mesmo a substituição dos princípios de solidariedade, altruísmo e ajuda mútua por valores como individualismo, lucro financeiro e pragmatismo, sob o argumento da denominada excelência de mercado. Deve-se procurar solucionar a alegada tensão entre a necessidade de eficiência e o imperativo de serem cumpridos os objetivos das políticas públicas sociais, com concretização da noção de solidariedade e humanismo. Nessa realidade, o fortalecimento da sociedade civil organizada mostre-se indispensável como força dinamizadora e mobilizadora em direção à construção de um Estado capaz de atender às necessidades da população. A pluralidade que é resultado de se incorporar também as assimetrias típicas da sociedade, a luta pelo fortalecimento e pela regeneração da participação social e a mobilização de grupos de pessoas reunidas em torno de interesses, valores e objetivos comuns são o pano de fundo do planejamento e da coordenação necessárias às atividades realizadoras das políticas de Estado.

4. Conclusão

Embora pareça que se esteja falando de coisas diversas, resta claro que o carnaval, a campanha da Fraternidade nesse tempo de quaresma e a própria discussão jurídica sobre políticas públicas no Direito Administrativo tratam de um mesmo aspecto: dar voz constitutiva dos direitos a que fazemos jus.

Cá da minha fé pessoal, peço para que tenhamos força para resistir, coragem para recusar a invisibilidade, persistência para dizer e, enfim, assumir o protagonismo que a Constituição da República, ao prever um Estado Democrático de Direito, reservou a cada cidadão brasileiro.

 

[1] Disponível em https://www.vidapastoral.com.br/artigos/temas-sociais/campanha-da-fraternidade-2019/.  Acesso em 06.03.2019.

[2] BUCCI, Maria Paula Dallari. Direito administrativo e políticas públicas. São Paulo: Saraiva, 2002. p. 264.

[3] JORGE NETO, Nagibe de Melo. O Controle jurisdicional das políticas públicas: concretizando a democracia e os direitos sociais fundamentais. Salvador: Juspodivm, 2009, 2ª tiragem, p. 52-53.

[4] BREUS, Thiago Lima. Políticas Públicas no Estado Constitucional: problemática da concretização dos Direitos Fundamentais pela Administração Pública brasileira contemporânea. Prefácio de Luiz Edson Fachin; Apresentação Angela Cassia Costaldello. Belo Horizonte: Fórum, 2007, p. 217-220.

[5] HEIDEMMAN, Francisco G.. Do sonho do progresso às políticas de desenvolvimento. In: Políticas Públicas e Desenvolvimento: bases epistemológicas e modelos de análise. Francisco G. Heidemann e José Francisco Salm, organizadores. Brasília: editora Universidade de Brasília, 2009, p. 30.

[6] SCHMIDT, João Pedro. Para entender a políticas públicas: aspectos conceituais e metodológicos. Direitos Sociais e Políticas Públicas: desafios contemporâneos. Tomo 8. Organizadores, Jorge Renato dos Reis e Rogério Gesta Leal. Santa Cruz do Sul: Edunisc, 2008. p. 2.311.

[7] HERMANY, Ricardo. O Plano Diretor e a participação social na esfera pública municipal. Direitos Sociais e Políticas Públicas: desafios contemporâneos. Tomo 7. Organizadores, Jorge Renato dos Reis e Rogério Gesta Leal. Santa Cruz do Sul: Edunisc, 2008. p.  1.943.

[8] BOSCO, Maria Goretti Dal. Discricionariedade em Políticas Públicas. Curitiba: Juruá, 2008, p. 249; 385 e 443.

[9] FARIA, Júlio Herman. Políticas públicas: o diálogo entre o jurídico e o político. A&C Revista de Direito Administrativo & Constitucional, ano 9, n. 35, jan/mar 2009, p. 166.

2 Comentários


  1. Cara Dra. Raquel,
    Fiquei honrado em ver um de meus artigos em sua lista bibliográfica. Dentro deste tema, sugiro que leia também, na mesma Revista A&C, Editora Fórum, edição 42: O controle do poder legislativo como direito-dever de participação do cidadão.
    Fico à disposição para trocarmos mais ideias.
    Abraço
    Julio Herman Faria,
    Curitiba Pr.
    *sou conterrâneo do Procurador de MG, Divinopolis, Dr. Gilberto Osorio Resende.

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