Licença maternidade: direito da contratada temporariamente pelo Estado

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1. Considerações preliminares sobre o quadro de pessoal do Estado

O Estado, quando exerce as competências que lhe são impostas pelo ordenamento, necessita valer-se de um quadro de pessoal capaz de exteriorizar vontades e realizar comportamentos que satisfaçam as necessidades da coletividade. São necessários profissionais que, além da realização pessoal, componham uma estrutura voltada para a realização do interesse público primário. Historicamente, vários são os modelos adotados para o vínculo firmado entre os trabalhadores públicos e a Administração. Em alguns deles prevalecem elementos privados, que aproximam o vínculo daquele que se estabelece no mercado de trabalho empresarial. Em outros predomina a ideia de um profissional encarregado basicamente de “servir ao público”, com o foco maior nas demandas coletivas a serem satisfeitas, em desfavor das necessidades individuais do trabalhador. Não há dúvida que a adoção de um modelo ou de outro depende da própria concepção de Estado adotado em cada país, com consagração na ordem jurídica de determinada ideologia inspiradora das opções sociais.

No Brasil, malgrado renovada e recente controvérsia doutrinária, atribui-se majoritariamente ao texto constitucional a opção pelo modelo de uma burocracia profissionalizada, submetida ao regime jurídico de direito público, com ênfase na valorização do mérito e da eficiência administrativa. O fato de a Constituição de 1988 ter optado pela expressão “servidor público” e não mais “funcionário público”, o caráter obrigatório dos planos de carreira (artigo 39, “caput” da CR, com vigência restaurada em razão da liminar proferida pelo STF na ADI nº 2.135-4) e as regras consagradas em dispositivos constitucionais como os incisos I, II e IX do artigo 37 evidenciariam a consagração do regime jurídico administrativo como aquele incidente, em regra, no vínculo funcional estabelecido entre o Poder Público e o seu quadro de pessoal. Não se trata de enquadrar o servidor como um trabalhador que teriam menos direitos e mais obrigações, mas apenas de reconhecer que a supremacia do interesse público primário justifica a exclusão do regime contratual e a adoção do regime unilateral estatutário.

Conforme entendimento ainda predominante, malgrado o novo espírito que possíveis reformas anunciam, o exercício das competências permanentes, comuns e típicas das pessoas jurídicas de direito público políticas ou administrativas se dará, em regra, por servidores submetidos ao regime jurídico estatutário. Nesse regime, os direitos e obrigações dos servidores são fixados, unilateralmente, pelo Poder Legislativo da esfera federativa a cujo quadro de pessoal se vincula o servidor. Em outras palavras, o ente federativo (União, Estado-membro, Município ou DF), por meio do seu Poder Legislativo (Congresso Nacional, Assembleia Legislativa, Câmara de Vereadores ou Assembleia Distrital), editará leis que veiculem o estatuto o qual estabelecerá direitos e deveres dos servidores encarregados do exercício das atividades típicas da própria pessoa federativa, bem como das suas autarquias e fundações públicas.

A ideia fundamental é a de que atividades típicas, essenciais e rotineiras imputadas às pessoas públicas adequam-se ao regime estatutário, senão vejamos: a natureza da função a ser exercida é pública, a natureza do recurso utilizado como contraprestação do trabalho é pública, os fins a serem atendidos são públicos, logo as normas regulamentadoras da relação devem ser públicas. O regime estatutário e o escalonamento de cargos efetivos propiciam a formação de uma carreira, estando os seus membros a salvo da descontinuidade. O mérito de assegurar a permanência na Administração é garantia que, em princípio, só o regime estatutário dá e em favor dos servidores efetivos que cumpram determinados requisitos constitucionais.[1]

Contudo, além da adoção do regime estatutário como regra para o quadro de pessoal da Administração Pública, tem-se consagradas exceções de modo expresso no ordenamento, como é o caso, v.g., dos titulares dos serviços notariais e de registro (artigo 236 da CR), dos empregados das empresas públicas e sociedades de economia mista (artigo 173, § 1º, II da CR) e dos contratados para necessidades temporárias de excepcional interesse público (artigo 37, IX da CR).

Especificamente quanto à contratação temporária, os Tribunais Superiores vêm reconhecendo a distinção entre os temporários e os servidores efetivos, sendo certo que os primeiros atendem necessidades temporárias e os efetivos demandas permanentes do serviço.[2]

 

2. Contrato temporário

Cumpre esclarecer que a Constituição da República somente admite o regime excepcional do artigo 37, IX nos casos de contratação por tempo determinado que sejam enumerados em lei “para atender necessidade temporária de excepcional interesse público”. A determinabilidade temporal do vínculo, a temporariedade da necessidade que o justifica e a excepcionalidade do interesse público presente na espécie deixam claro que se trata de contratos transitórios voltados à satisfação de demandas extraordinárias, temporárias e que consubstanciam interesse excepcional da coletividade.

Segundo a doutrina, está-se diante de figura ímpar no seio das espécies de prestação laboral do Estado, sendo que “O regime jurídico dos servidores admitidos em serviços de caráter temporário ou contratados para funções de natureza técnica será estabelecido em lei especial”, visto que a Constituição “Facultou ao Poder Público, mediante lei, disciplinar um novo regime jurídico, diverso do estatutário e do celetista, para as hipóteses que mencionou.”[3]

Resulta desse contexto a legitimidade de cada ente federativo editar seu próprio diploma autorizando a contratação temporária, uma vez que: “O primeiro requisito da contratação temporária é a sua previsão em lei formal, a qual deverá ser editada no âmbito de cada unidade federativa, uma vez que as questões referentes à forma de admissão de pessoal para o serviço público estão abrangidas na autonomia político-administrativa da União, dos Estados-membros, o Distrito Federal e dos Municípios.”[4]

Havendo expressa previsão legal, a interpretação das hipóteses autorizativas de contratação temporária deve se dar restritivamente, consoante vem decidindo a Corte Suprema: “A exceção prevista no inciso IX do art. 37 da CF deve ser interpretada restritivamente, cabendo ao legislador infraconstitucional a observância dos requisitos da reserva legal, da atualidade do excepcional interesse público justificador da contratação temporária e da temporariedade e precariedade dos vínculos contratuais. 2. A Lei Complementar 12/1992 do Estado do Mato Grosso valeu-se de termos vagos e indeterminados para deixar ao livre arbítrio do administrador a indicação da presença de excepcional interesse publico sobre virtualmente qualquer atividade, admitindo ainda a prorrogação dos vínculos temporários por tempo indeterminado, em franca violação ao art. 37, IX, da CF. 3. Ação direta julgada procedente, para declarar inconstitucional o art. 264, inciso VI e § 1º, parte final, da Lei Complementar 4/90, ambos com redação conferida pela LC 12/92, com efeitos ex nunc, preservados os contratos em vigor que tenham sido celebrados exclusivamente com fundamento nos referidos dispositivos, por um prazo máximo de até 12 (doze) meses da publicação da ata deste julgamento.”[5]

A lei que prevê a contratação temporária é que delineia, em regra, os direitos integrantes do universo jurídico dos servidores contratados, sendo de natureza pública o vínculo firmado entre estes e a Administração:

“O regime jurídico que informa a relação funcional acordada entre o contratado e a entidade pública contratante deve ser estabelecido na lei que prevê a hipótese constitucional e a regulamenta no âmbito de cada qual das entidades políticas. É certo, todavia, que, seja qual for o conjunto de direitos, deveres e responsabilidades firmadas legalmente para as partes, será aquela sempre uma relação de direito público, firmando-se nos princípios e regras do direito administrativo.”[6]

O Superior Tribunal de Justiça em mais de uma hipótese reconheceu a natureza estatutária do vínculo entre o Poder Público e os contratados temporários: “A jurisprudência do STJ entende que, diante da necessidade temporária de excepcional interesse público (art. 37, IX, da CF/1988), havendo a contratação temporária regrada por lei especial, o vínculo que se estabelece entre o Poder Público e o servidor é de natureza estatutária, e não celetista, o que afasta a competência da Justiça trabalhista.”[7]

Estamos tratando, portanto, de hipótese em que a lei estabelece um regime jurídico adequado a situações em que há determinabilidade temporal (ou seja, situação que justifica não pode ser indeterminada, variando o prazo conforme a lei), temporariedade (presente quando há atividade de caráter eventual e, também, quando há circunstâncias especiais de serviços de natureza permanente como é o caso de afastamento de servidores efetivos em licença saúde), bem como excepcional interesse público (ou seja, situações comuns não podem ensejar chamamento, visto que excepcional é o fora do ordinário, alheio, singular, estranho, ímpar). Tais características são compatíveis com um regime jurídico administrativo próprio, adequado à excepcionalidade da contratação que, inclusive, não é compatível com a ideia de estabilidade, hoje restrita pelo artigo 41 da CR aos titulares de cargos efetivos.

Pode-se afirmar que não só a estabilidade do artigo 41 da CR é inaplicável em favor dos contratados temporários, como eles não fazem jus à estabilidade do art. 19 do ADCT. A propósito confira-se entendimento do STJ no sentido de que “inexiste direito líquido e certo à estabilidade no serviço público para aqueles que – sob a égide da atual Constituição, sem aprovação prévia em concurso público – são contratados por tempo determinado para atender a necessidade temporária de excepcional interesse público”.[8] Sendo assim, essas contratações são precárias, sendo inadmissível pleitear aplicação de dispositivos como o artigo 19 do ADCT.[9] Na verdade, os Tribunais Superiores vem assentando que contratações temporárias inconstitucionais não apenas não geram estabilidade, ainda que prorrogadas reiteradamente, como a inconstitucionalidade sequer se sujeita ao prazo decadencial de autotutela administrativa, o que implica possibilidade de seu reconhecimento a qualquer momento, com efeito invalidatório retroativo.[10]

Findo o prazo previsto para o contrato temporário, a jurisprudência proclama que o vínculo se extingue e não há, em regra, que se falar em prorrogação, ainda que haja previsão legal nesse sentido: “Vencido o prazo do contrato, ainda que haja lei prevendo a sua prorrogação, tal fato não obriga a Administração Pública, que com olhos na supremacia do interesse público, deixou de fazê-lo por não mais persistir a necessidade da respectiva contratação.”[11]

Tem sido expressamente admitida a rescisão imediata do vínculo, com dispensa dos contratados, sem qualquer impugnação possível em face da decisão administrativa: “3. Professores temporários contratados pelo Estado do Pará com fundamento na LC 7/91, que dispõe sobre a contratação por tempo determinado para atender à necessidade temporária de excepcional interesse público. 4. Hipótese em que os impetrantes tinham pleno conhecimento da situação na qual estavam inseridos durante todo o período em que permaneceram no serviço público, ou seja, de que seu vínculo com a Administração tinha caráter meramente temporário. 5. A eventual dispensa dos professores contratados temporariamente prescinde da anulação de qualquer ato administrativo, dependendo apenas da observância ao que determina a lei e a Constituição Federal. Não há, no caso, um ato concreto a permitir a convalidação dos seus efeitos em razão do decurso do tempo.”[12]

Sublinhe-se que uma das principais distinções entre o cargo efetivo e a contratação temporária é exatamente a estabilidade que pode adquirir o titular do primeiro e que é recusada ao que é contratado por tempo determinado, sendo neste segundo caso o vínculo passível de extinção assim que ultimado o prazo avençado entre as partes.

Já é clássico o entendimento dos Tribunais de Justiça sobre a matéria: “A função pública temporária tem natureza precária e a Administração Pública detém discricionariedade para exonerar ad nutum o servidor contratado a título precário, independentemente de prévio processo administrativo. Igualmente, não há que se falar em direito à indenização em virtude da dispensa ad nutum de servidor detentor de função pública temporária, da mesma forma como ocorre com os ocupantes de cargos comissionadas ou de confiança.”[13]

 

3. Hipótese extraordinária de estabilidade em contrato temporário

Cumpre elucidar que, em situações extraordinárias, a amplitude da liberdade para rescindir o vínculo com contratados temporários pode encontrar limites fixados no próprio texto constitucional. Esse é o caso do princípio que protege a dignidade humana e os direitos sociais como saúde, trabalho, previdência social e proteção à maternidade previstos no artigo 6º da CR. O artigo 39, § 3º da Constituição da República, alterado pela Emenda Constitucional 19/98, estende aos servidores ocupantes de cargos públicos alguns direitos sociais previstos no artigo 7º da CR para os trabalhadores urbanos e rurais. Sobre a aplicação do artigo 39, § 3º da Constituição da República aos contratados temporários, a doutrina assevera:

“Embora o art. 39 mencione expressamente cargos públicos, entendemos estarem aí inseridos os comissionados e temporários, devendo os incisos citados do art. 7º, constituir a descrição dos direitos funcionais aplicados a todos os servidores de modo geral, se de modo diferente não dispuser legislação específica.”[14]

Malgrado divergência quanto ao transcrito entendimento, a sua incidência quanto aos incisos I e XVIII do artigo 7º da CR é clara na jurisprudência do STF, consoante se demonstrará a seguir. É no inciso XVIII do artigo 7º da CR que se encontra a licença à gestante, sem prejuízo do emprego e do salário, com a duração de cento e vinte dias e no inciso I a relação de emprego protegida contra despedida arbitrária ou sem justa causa, nos termos de lei complementar, que preverá indenização compensatória, dentre outros direitos. Outrossim, o artigo 10 do ADCT determina que, “até que seja promulgada a lei complementar a que se refere o art. 7º, I, da Constituição: (…) II – fica vedada a dispensa arbitrária ou sem justa causa: (…) b) da empregada gestante, desde a confirmação da gravidez até cinco meses após o parto.” Sobre o referido dispositivo, entende-se ser “leading case” sobre a matéria o seguinte julgado do STF:

“CONSTITUCIONAL. LICENÇA-MATERNIDADE. CONTRATO TEMPORÁRIO DE TRABALHO. SUCESSIVAS CONTRATAÇÕES. ESTABILIDADE PROVISÓRIA. ART. 7º, XVIII DA CONSTITUIÇÃO. ART. 10, II, b do ADCT. RECURSO DESPROVIDO. A empregada sob regime de contratação temporária tem direito à licença-maternidade, nos termos do art. 7º, XVIII da Constituição e do art. 10, II, b do ADCT, especialmente quando celebra sucessivos contratos temporários com o mesmo empregador. Recurso a que se nega provimento.”[15]

Considerando-se a aplicação do artigo 39, § 3º e que as contratadas temporárias vinculam-se ao regime geral de Previdência, cumpre atentar para a Lei Federal nº 8.213/91 e seu decreto regulamentador (Decreto Federal nº 3.048/99).

“Art. 71. O salário-maternidade é devido à segurada da Previdência Social, durante 120 (cento e vinte) dias, com início no período entre 28 (vinte e oito) dias antes do parto e a data de ocorrência deste, observadas as situações e condições previstas na legislação no que concerne à proteção à maternidade. (Redação dada pala Lei nº 10.710, de 5.8.2003)

Art. 71-A.  Ao segurado ou segurada da Previdência Social que adotar ou obtiver guarda judicial para fins de adoção de criança é devido salário-maternidade pelo período de 120 (cento e vinte) dias. (Redação dada pela Lei nº 12.873, de 2013)

  • 1oO salário-maternidade de que trata este artigo será pago diretamente pela Previdência Social. (Redação dada pela Lei nº 12.873, de 2013)
  • 2oRessalvado o pagamento do salário-maternidade à mãe biológica e o disposto no art. 71-B, não poderá ser concedido o benefício a mais de um segurado, decorrente do mesmo processo de adoção ou guarda, ainda que os cônjuges ou companheiros estejam submetidos a Regime Próprio de Previdência Social.(Incluído pela Lei nº 12.873, de 2013)

Art. 71-B. No caso de falecimento da segurada ou segurado que fizer jus ao recebimento do salário-maternidade, o benefício será pago, por todo o período ou pelo tempo restante a que teria direito, ao cônjuge ou companheiro sobrevivente que tenha a qualidade de segurado, exceto no caso do falecimento do filho ou de seu abandono, observadas as normas aplicáveis ao salário-maternidade. (Incluído pela Lei nº 12.873, de 2013)  (Vigência)

I – a remuneração integral, para o empregado e trabalhador avulso; (Incluído pela Lei nº 12.873, de 2013)  (Vigência)

II – o último salário-de-contribuição, para o empregado doméstico; (Incluído pela Lei nº 12.873, de 2013)  (Vigência)

III – 1/12 (um doze avos) da soma dos 12 (doze) últimos salários de contribuição, apurados em um período não superior a 15 (quinze) meses, para o contribuinte individual, facultativo e desempregado; e (Incluído pela Lei nº 12.873, de 2013)  (Vigência)

IV – o valor do salário mínimo, para o segurado especial. (Incluído pela Lei nº 12.873, de 2013)  (Vigência)

Art. 71-C. A percepção do salário-maternidade, inclusive o previsto no art. 71-B, está condicionada ao afastamento do segurado do trabalho ou da atividade desempenhada, sob pena de suspensão do benefício. (Incluído pela Lei nº 12.873, de 2013)  (Vigência)

Art. 72. O salário-maternidade para a segurada empregada ou trabalhadora avulsa consistirá numa renda mensal igual a sua remuneração integral.     (Redação Dada pela Lei nº 9.876, de 26.11.99)

Art. 73. Assegurado o valor de um salário-mínimo, o salário-maternidade para as demais seguradas, pago diretamente pela Previdência Social, consistirá: (Redação dada pela Lei nº 10.710, de 5.8.2003)

I – em um valor correspondente ao do seu último salário-de-contribuição, para a segurada empregada doméstica; (Incluído pela lei nº 9.876, de 26.11.99)

II – em um doze avos do valor sobre o qual incidiu sua última contribuição anual, para a segurada especial; (Incluído pela lei nº 9.876, de 26.11.99)

III – em um doze avos da soma dos doze últimos salários-de-contribuição, apurados em um período não superior a quinze meses, para as demais seguradas. (Incluído pela lei nº 9.876, de 26.11.99)

O Decreto nº 3.048/99, que veiculou o Regulamento da Previdência Social, detalhou pormenorizou o cálculo e pressupostos do referido benefício:

“Art. 93.  O salário-maternidade é devido à segurada da previdência social, durante cento e vinte dias, com início vinte e oito dias antes e término noventa e um dias depois do parto, podendo ser prorrogado na forma prevista no § 3o(Redação dada pelo Decreto nº 4.862, de 2003)

  • 1ºPara a segurada empregada, inclusive a doméstica, observar-se-á, no que couber, as situações e condições previstas na legislação trabalhista relativas à proteção à maternidade.
  • 2oSerá devido o salário-maternidade à segurada especial, desde que comprove o exercício de atividade rural nos últimos dez meses imediatamente anteriores à data do parto ou do requerimento do benefício, quando requerido antes do parto, mesmo que de forma descontínua, aplicando-se, quando for o caso, o disposto no parágrafo único do art. 29. (Redação dada pelo Decreto nº 5.545, de 2005)
  • 3º  Em casos excepcionais, os períodos de repouso anterior e posterior ao parto podem ser aumentados de mais duas semanas, mediante atestado médico específico. (Redação dada pelo Decreto nº 3.668, de 2000)
  • 4ºEm caso de parto antecipado ou não, a segurada tem direito aos cento e vinte dias previstos neste artigo.
  • 5ºEm caso de aborto não criminoso, comprovado mediante atestado médico, a segurada terá direito ao salário-maternidade correspondente a duas semanas. (Redação dada pelo Decreto nº 3.668, de 2000)

Art. 93-A.  O salário-maternidade é devido à segurada da Previdência Social que adotar ou obtiver guarda judicial para fins de adoção de criança com idade: (Incluído pelo Decreto nº 4.729, de 2003)

I – até um ano completo, por cento e vinte dias; (Incluído pelo Decreto nº 4.729, de 2003)

II – a partir de um ano até quatro anos completos, por sessenta dias; ou(Incluído pelo Decreto nº 4.729, de 2003)

III – a partir de quatro anos até completar oito anos, por trinta dias. (Incluído pelo Decreto nº 4.729, de 2003)

  • 1º O salário-maternidade é devido à segurada independentemente de a mãe biológica ter recebido o mesmo benefício quando do nascimento da criança.(Incluído pelo Decreto nº 4.729, de 2003)
  • 2ºO salário-maternidade não é devido quando o termo de guarda não contiver a observação de que é para fins de adoção ou só contiver o nome do cônjuge ou companheiro. (Incluído pelo Decreto nº 4.729, de 2003)
  • 3ºPara a concessão do salário-maternidade é indispensável que conste da nova certidão de nascimento da criança, ou do termo de guarda, o nome da segurada adotante ou guardiã, bem como, deste último, tratar-se de guarda para fins de adoção. (Incluído pelo Decreto nº 4.729, de 2003)
  • 4ºQuando houver adoção ou guarda judicial para adoção de mais de uma criança, é devido um único salário-maternidade relativo à criança de menor idade, observado o disposto no art. 98. (Incluído pelo Decreto nº 4.729, de 2003)
  • 5ºA renda mensal do salário-maternidade é calculada na forma do disposto nos arts. 94, 100 ou 101, de acordo com a forma de contribuição da segurada à Previdência Social. (Incluído pelo Decreto nº 4.729, de 2003)
  • 6oO salário-maternidade de que trata este artigo é pago diretamente pela previdência social.  (Incluído pelo Decreto nº 4.862, de 2003)

Art. 94.  O salário-maternidade para a segurada empregada consiste numa renda mensal igual à sua remuneração integral e será pago pela empresa, efetivando-se a compensação, observado o disposto no art. 248 da Constituição, quando do recolhimento das contribuições incidentes sobre a folha de salários e demais rendimentos pagos ou creditados, a qualquer título, à pessoa física que lhe preste serviço, devendo aplicar-se à renda mensal do benefício o disposto no art. 198. (Redação dada pelo Decreto nº 4.862, de 2003)

  • 1º – revogado
  • 2º – revogado
  • 3o A empregada deve dar quitação à empresa dos recolhimentos mensais do salário-maternidade na própria folha de pagamento ou por outra forma admitida, de modo que a quitação fique plena e claramente caracterizada.(Incluído pelo Decreto nº 4.862, de 2003)
  • 4o A empresa deve conservar, durante dez anos, os comprovantes dos pagamentos e os atestados ou certidões correspondentes para exame pela fiscalização do INSS, conforme o disposto no § 7odo art. 225. (Incluído pelo Decreto nº 4.862, de 2003)

Art. 95.  Compete à interessada instruir o requerimento do salário-maternidade com os atestados médicos necessários. (Redação dada pelo Decreto nº 3.668, de 2000)

Parágrafo único.  Quando o benefício for requerido após o parto, o documento comprobatório é a Certidão de Nascimento, podendo, no caso de dúvida, a segurada ser submetida à avaliação pericial junto ao Instituto Nacional do Seguro Social. (Redação dada pelo Decreto nº 3.668, de 2000)

Art. 96.  O início do afastamento do trabalho da segurada empregada será determinado com base em atestado médico ou certidão de nascimento do filho. (Redação dada pelo Decreto nº 4.862, de 2003)

Art. 97.  O salário-maternidade da segurada empregada será devido pela previdência social enquanto existir relação de emprego, observadas as regras quanto ao pagamento desse benefício pela empresa. (Redação dada pelo Decreto nº 6.122, de 2007)

Parágrafo único.  Durante o período de graça a que se refere o art. 13, a segurada desempregada fará jus ao recebimento do salário-maternidade nos casos de demissão antes da gravidez, ou, durante a gestação, nas hipóteses de dispensa por justa causa ou a pedido, situações em que o benefício será pago diretamente pela previdência social. (Incluído pelo Decreto nº 6.122, de 2007)

Art. 98. No caso de empregos concomitantes, a segurada fará jus ao salário-maternidade relativo a cada emprego.

Art. 99. Nos meses de início e término do salário-maternidade da segurada empregada, o salário-maternidade será proporcional aos dias de afastamento do trabalho.

Art. 100.  O salário-maternidade da segurada trabalhadora avulsa, pago diretamente pela previdência social, consiste numa renda mensal igual à sua remuneração integral equivalente a um mês de trabalho, devendo aplicar-se à renda mensal do benefício o disposto no art. 198. (Redação dada pelo Decreto nº 4.862, de 2003)

Art. 101.  O salário-maternidade, observado o disposto nos arts. 35, 198, 199 ou 199-A, pago diretamente pela previdência social, consistirá: (Redação dada pelo Decreto nº 6.722, de 2008).

I – em valor correspondente ao do seu último salário-de-contribuição, para a segurada empregada doméstica; (Incluído pelo Decreto nº 3.265, de 1999)

II – em um salário mínimo, para a segurada especial; (Incluído pelo Decreto nº 3.265, de 1999)

III – em um doze avos da soma dos doze últimos salários-de-contribuição, apurados em período não superior a quinze meses, para as seguradas contribuinte individual, facultativa e para as que mantenham a qualidade de segurada na forma do art. 13. (Redação dada pelo Decreto nº 6.122, de 2007)

  • 3oO documento comprobatório para requerimento do salário-maternidade da segurada que mantenha esta qualidade é a certidão de nascimento do filho, exceto nos casos de aborto espontâneo, quando deverá ser apresentado atestado médico, e no de adoção ou guarda para fins de adoção, casos em que serão observadas as regras do art. 93-A, devendo o evento gerador do benefício ocorrer, em qualquer hipótese, dentro do período previsto no art. 13. (Incluído pelo Decreto nº 6.122, de 2007)

Decorre do contexto normativo que as servidoras que mantém vínculo com o Poder Público, mediante contrato temporário embasado em legislação própria, têm direito à garantia de emprego até o quinto mês após o parto (inseridos nesse período os cento e vinte dias de licença maternidade), tratando-se de direito fundamental social cuja operacionalização deve observâncias às leis de regência, promulgadas no âmbito federal e estadual.

O Supremo Tribunal Federal vem assentando que o legislador brasileiro, a partir de 1932 e mais claramente desde 1974, vem tratando a questão da proteção à maternidade, incluída aí a garantia de emprego da gestante, cada vez menos como um encargo do empregador e cada vez mais como de natureza previdenciária. A preocupação é sempre evitar discriminações indevidas, como desdobramento do princípio da igualdade de direitos previsto no inciso I do art. 5º da Constituição da República[16] e desassossego da gestante e mãe nos primeiros meses após o parto, período de significativos desafios. Os demais Tribunais, seguindo a mesma linha de raciocínio, fixam que, diante dos laços da maternidade, o direito social à licença deve ser preservado[17], bem como a garantia de emprego, capaz de dar um mínimo de segurança quanto à sobrevivência da mãe e do seu filho[18].

 

4. Licença maternidade: proteção à criança

Já se compreende a criança como principal destinatária de garantias como a licença maternidade, sendo a mulher sua beneficiária mediata. Se inicialmente entendia-se esse tipo de proteção como um lapso temporal destinado a proteger predominantemente a saúde da mulher, hoje em dia reconhece-se os meses de gestação e primeiros meses de vida do bebê como o período destinado a realização de vários exames, controles e, em seguida, vacinas, acompanhamento de crescimento da criança e, principalmente, início do relacionamento íntimo entre mãe e filho. Trata-se de aspecto que não pode ser ignorado pelo intérprete do Direito, por ser essencial para estabilidade do núcleo familiar, objeto de clara proteção da ordem jurídica.

Frise-se que a criança é tratada pelo ordenamento hodierno como uma pessoa em desenvolvimento cujos direitos devem ser protegidos em sua integralidade máxima. Não se ignore que o Brasil ratificou a Convenção das Nações Unidas sobre os direitos das crianças que, por sua vez, consagrou o princípio da proteção integral. Também foi ratificada, ainda em 1934, a Convenção nº 3 da Organização Internacional do Trabalho que garantiu o direito à licença maternidade, devendo-se atentar para a Convenção OIT nº 103, de 1952, promulgada pelo Decreto nº 58.821/66 (artigo VI). No artigo 6º da referida Convenção 103 tem-se qualificada como ilegal a dispensa da gestante: “Quando uma mulher se ausentar de seu trabalho em virtude das disposições do Artigo 3º do presente Convênio, será ilegal que seu empregador lhe comunique sua dispensa durante tal ausência, ou que lhe seja comunicada de forma que o prazo marcado no aviso expire durante a mencionada ausência”. Outrossim, tem-se clara no artigo 1º do Estatuto da Criança e do Adolescente a condição das crianças como sujeitos de direitos. Nesse contexto, regras dispostas em legislação estadual, municipal ou federal, as políticas públicas relativas à infância e adolescência e as interpretações administrativas que repercutam nessa seara devem atentar para a proteção máxima possível aos beneficiários.

Tal premissa assume maior relevância em face do complexo período de gravidez e da fragilidade inerente aos recém-nascidos, sendo a certeza remuneratória uma garantia capaz de assegurar maior tranquilidade à família. A ausência de preocupação imediata com a sobrevivência permite que sejam estabelecidos laços afetivos entre a mãe e o bebê que são de importância indiscutível no desenvolvimento físico, mental e social da criança, bem como na estabilização do núcleo familiar, tratando-se de direito fundamental apto a balizar a hermenêutica de regras de direito público integrantes do regime jurídico administrativo.

Sobre a matéria, Líria dos Santos Paula e Déborah Lídia Lobo Muniz afirmam a importância de uma tranquilidade mínima para a gestante e, ainda, da presença da mãe para o desenvolvimento e evolução organizacional da criança nos primeiros meses de vida, aspecto psicológico e da saúde em volta do novo ser humano que chega ao mundo, inserindo-se no núcleo familiar:

“A importância fundamental da proteção dispensada pelo legislador à gestante e para à criança é explicada por psicólogos e médicos, os quais asseveram a importância da amamentação da criança e a companhia da mãe durante os primeiros meses mais frágeis da vida de um bebê. Prova disso é o que Spitz (1996, p. 92) relata em sua obra O Primeiro Ano de Vida. Ele explica que a inter-relação entre mãe e filho durante esta grande fase da vida é fundamental à criança. Essas experiências e as ações intencionais constituem grande e sensível desenvolvimento da personalidade do bebê, já que o contato físico e sentimental de mãe para com o filho é essencial, o que vai se aperfeiçoando gradualmente no decorrer de seu primeiro ano de vida (SPITZ, 1996, p. 93 e 99). Na mesma seqüência, ele consagra que, no decorrer dos primeiros seis meses de vida do bebê, o sistema preceptivo, o sensorial do bebê, está em estado de transição o que se traduz imperativo a presença constante da mãe.

(…) Assim, fica clara a intenção do legislador ao garantir proteção integral à maternidade e à infância, e ao atribuir igualdade a qualquer criança que esteja unida a um núcleo familiar, seja essa união através da gestação ou da adoção.”[19]

Seguindo esses parâmetros, tem-se a garantia fixada no artigo 10 do ADCT no sentido de proibir dispensa arbitrária ou sem justa causa “da empregada gestante, desde a confirmação da gravidez até cinco meses após o parto”. Sobre esse dispositivo, certo é que a expressão “empregada” atinge também as contratadas temporárias pelo Estado, protegendo não apenas as mulheres grávidas que mantém vínculos de emprego privados e as servidoras efetivas, mas também aquelas que exercem funções em caráter excepcional e temporário em favor da Administração Pública. Nesse sentido, para a outorga da estabilidade à gestante, não importa a natureza do vínculo firmado entre ela e o Poder Público: estatutário, emprego público ou função pública. Especificamente sobre as contratadas temporárias, também elas enquanto gestantes e mães, bem como seus nascituros, fazem jus à proteção constitucional, que lhes dá segurança financeira transitória com a inerente tranquilidade de subsistência capaz de ampará-los nesse período de intensas transformações. Frise-se que essa proteção é outorgada em decorrência do estado gestacional, sem qualquer vinculação com as características do cargo exercido, mas sim com a necessidade de proteção familiar, em especial do nascituro. Nesse sentido, os Pretórios afirmam que a licença visa à proteção não apenas da gestante, mas, principalmente, do nascituro.

Não se mostra razoável promover a proteção de determinado grupo de nascituros e desguarnecer outro, sem que haja justificado motivo de tratamento diferenciado, sob pena de vulneração dos princípios constitucionais da igualdade e da dignidade (art. 5º, caput e art. 1º, III da CF/88) e mesmo do direito à proteção da maternidade e infância (art. 6º)[20]. O que se afirma é que impor à contratada temporariamente tratamento diferenciado em relação à estabilidade provisória e licença maternidade implicaria ato discriminatório em total afronta ao ideal de justiça preconizado no art. 6º e 7º, VIII do texto constitucional sobre a proteção à maternidade e a licença à gestante[21].
Reexame necessário e apelação – ação ordinária – contrato temporário por prazo determinado – gestante – licença maternidade – dispensa – estabilidade provisória – previsão constitucional – princípio da isonomia – precedentes do STF – FGTS – indevido – verba de natureza celetista – art. 39, § 3º da CR – sentença parcialmente reformada em reexame necessário – recurso voluntário prejudicado.
1 – A servidora contratada temporariamente por prazo determinado tem direito à estabilidade constitucional e licença maternidade, nos termos do art. 7º, XVIII da Constituição e do art. 10, II, b do ADCT.
2 – Impor-lhe tratamento diferenciado em relação a este direito social implicaria ato discriminatório em total afronta ao ideal de justiça preconizado no texto constitucional de proteção à maternidade e à licença à gestante (art. 6º e 7º, VIII).
3 – O servidor, contratado para o exercício de função temporária, tem sua relação regida com a Administração Pública pelo contrato administrativo, de natureza estatutária, o que lhe garante a percepção das verbas previstas no art. 39, § 3º da Constituição da República. O FGTS não está elencado neste rol.

Exatamente por isso e considerando que “A excepcionalidade da tutela constitucional conferida à maternidade, particularmente à gestante, está evidenciada na vedação à despedida arbitrária ou sem justa causa da empregada gestante, desde a confirmação da gravidez até cinco meses após o parto (art. 10, II, “b”, do ADCT – CF/88) e na licença à gestante, sem prejuízo do emprego e do salário, com a duração de cento e vinte dias (art. 7º, XVIII, da CF/88)”, a jurisprudência fixa que as normas constitucionais “garantem a toda mulher com vínculo de trabalho a garantia da licença maternidade, posto que, quando do início da gestação, estava presente tal vínculo”[22].

No momento em que se pondera o interesse público em ver o contrato temporário findo ao final do prazo e a proteção constitucional à mulher gestante até o quinto mês posterior ao parto, de incidência induvidosa na espécie, a própria exigência de razoabilidade evidencia a necessidade de preservar o conteúdo mínimo do direito fundamental da gestante e mãe. Observe-se que tal questionamento resume exatamente a questão ora em exame, visto que, comprovada a gravidez da contratada temporária, não há como preservar o interesse público de a dispensar, em face da proteção da vida, da família e da dignidade humana (princípios em que se ampara  a regra do artigo 10, II, b do ADCT e artigo 7º, I e XVIII da CR). Segundo o Advogado da União José Ricardo Britto Seixas Pereira Júnior,  “E sob que hermenêutica a jurisprudência compatibiliza a precariedade dos cargos em comissão com normas que conferem estabilidade a gestante? Como é possível harmonizar o princípio da supremacia do interesse público com o princípio da proteção da vida e família.

Ao estudioso desavisado, vê-se um suposto antagonismo entre o direito individual da gestante em ter estabilidade no cargo com consequente remuneração e da administração pública que tem a prerrogativa de livremente dispor dos cargos em comissão.

Contudo, como se sabe, o chamado conflito entre princípios resolve-se pelo método ponderação de valores, sem a exclusão definitiva de algum deles do ordenamento jurídico.

Já o conflito entre regras é resolvido pelo método do “tudo ou nada” (uma regra é aplicada em sua totalidade, enquanto as demais são consideradas inválidas) e da subsunção.

No caso, a jurisprudência ultrapassou a análise das regras apresentadas, ou dados conforme lição de Renato Geraldo Mendes, passando a realizar uma análise principiológica do caso concreto, resguardando a norma jurídica. (…)

A luz da jurisprudência já sedimentada, comprova-se que resta assegurada às gestantes ocupantes de cargos em comissão e seus nascituros a estabilidade financeira necessária para conferir uma gravidez tranquila, evitando prejuízos a saúde do nascituro em decorrência de eventual instabilidade financeira da genitora.

Assim, de forma harmônica e utilizando uma hermenêutica principiológica, o Poder Judiciário compatibilizou a prerrogativa do poder público em livremente nomear e exonerar os cargos comissão com o direito constitucional das gestantes para não serem demitidas ou exoneradas até, no mínimo, cinco meses após o parto.

Para tanto, foi garantido às gestantes eventualmente exoneradas de cargos em comissão o direito liquido e certo de receber indenização substitutiva equivalente ao valor da remuneração que seria devida caso permanecessem no cargo, até o fim da estabilidade gestacional.

E mais, tal indenização pode ser exigida via mandado de segurança que implicará em pagamento imediato da indenização sem a necessidade de pagamento via precatório.

Desta forma, cabe a administração pública observar a interpretação judicial já sedimentada, assegurando o direito constitucional das gestantes comissionadas e de seus nascituros, viabilizando uma gravidez tranquila e sem sobressaltos mesmo em caso de necessidade de exoneração do cargo em comissão eventualmente ocupados pelas gestantes.”[23]

Em face de tais considerações, é mister reiterar que nenhum aspecto pode afastar o entendimento de que a gravidez é um estado físico que merece ampla proteção da Constituição, o mesmo ocorrendo com os primeiros meses de vida do recém-nascido. O Ministro Dias Toffoli, ao relatar o RE nº 420.839-DF, deixou assentado que as servidoras em estado gestacional têm direito à licença-maternidade e à estabilidade provisória, nos termos do art. 7º, inciso XVIII, c/c o art. 39, § 3º, da Constituição Federal, e art. 10, inciso II, alínea b, do ADCT” (DJe de 25.03.2012) e, ao decidir o Agravo Regimental no RE nº 368.460-MT deixou ementado o entendimento de que servidora no gozo de licença gestante faz jus à estabilidade provisória (DJe de 25.04.2012). Na mesma linha de raciocínio, o seguinte acórdão:

“O acesso da servidora pública e da trabalhadora gestantes à estabilidade provisória, que se qualifica como inderrogável garantia social de índole constitucional, supõe a mera confirmação objetiva do estado fisiológico de gravidez, independentemente, quanto a este, de sua prévia comunicação ao órgão estatal competente ou, quando for o caso, ao empregador. Doutrina. Precedentes. – As gestantes – quer se trate de servidoras públicas, quer se cuide de trabalhadoras, qualquer que seja o regime jurídico a elas aplicável, não importando se de caráter administrativo ou de natureza contratual (CLT), mesmo aquelas ocupantes de cargo em comissão ou exercentes de função de confiança ou, ainda, as contratadas por prazo determinado, inclusive na hipótese prevista no inciso IX do art. 37 da Constituição, ou admitidas a título precário – têm direito público subjetivo à estabilidade provisória, desde a confirmação do estado fisiológico de gravidez até cinco (5) meses após o parto (ADCT, art. 10, II, “b”), e, também, à licença-maternidade de 120 dias (CF, art. 7º, XVIII, c/c o art. 39, § 3º), sendo-lhes preservada, em consequência, nesse período, a integridade do vínculo jurídico que as une à Administração Pública ou ao empregador, sem prejuízo da integral percepção do estipêndio funcional ou da remuneração laboral. Doutrina. Precedentes. Convenção OIT nº 103/1952. – Se sobrevier, no entanto, em referido período, dispensa arbitrária ou sem justa causa de que resulte a extinção do vínculo jurídico- -administrativo ou da relação contratual da gestante (servidora pública ou trabalhadora), assistir-lhe-á o direito a uma indenização correspondente aos valores que receberia até cinco (5) meses após o parto, caso inocorresse tal dispensa. Precedentes.”[24]

O Superior Tribunal de Justiça vem decidindo, com lucidez: “AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA. ADMINISTRATIVO E CONSTITUCIONAL. DISPENSA DE SERVIDORA CONTRATADA EM CARÁTER TEMPORÁRIO DURANTE O PERÍODO DE GESTAÇÃO. ARTS. 7º, XVIII, DA CF E 10, II, B, DO ADCT. INDENIZAÇÃO SUBSTITUTIVA DA ESTABILIDADE PROVISÓRIA. POSSIBILIDADE. (…) 1. De acordo com a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, as servidoras públicas, incluídas as contratadas a título precário, independentemente do regime jurídico de trabalho, possuem direito à licença-maternidade e à estabilidade provisória, desde a confirmação da gravidez até cinco meses após o parto, consoante dispõem os arts. 7º, XVIII, da Constituição Federal e 10, II, b, do ADCT, sendo a elas assegurada a indenização correspondente às vantagens financeiras pelo período constitucional da estabilidade. Precedentes.” [25]

Registre-se, ainda, que o STF reconheceu ter repercussão geral o direito à estabilidade provisória e à licença maternidade quando se está diante de contratados por prazo determinado e de ocupantes de cargos comissionados, não titulares de cargos efetivos.[26] Embora ainda não decidida a matéria pela Corte Suprema, tem-se que, em outras oportunidades, foram assegurados efeitos previdenciários a contratos temporários, mesmo quando da sua inconstitucionalidade[27], o que evidencia o perfeito cabimento da ponderação entre a proteção constitucional a especiais direitos fundamentais (como o da mãe e do nascituro) em face do cumprimento das exigências formais de regras da CR.

Não seria sequer legítimo que na via administrativa qualquer decisão comprometa a proteção constitucional à gestante, estendida até sua licença maternidade, e ao nascituro, tendo em vista maciça orientação jurisprudencial contemporânea. Buscando o equacionamento entre essa reconhecida proteção à gestante, mesmo quando contratada temporariamente, e a proteção do interesse público, tem-se decisões fixando como devida indenização compensatória, no valor da remuneração da função pública exercida pela servidora, da confirmação da gravidez até cinco meses após o parto.

Destarte, impõe-se reconhecer a proteção remuneratória e previdenciária outorgada pela Constituição à gestante durante o período vulnerável da gravidez e dos meses subsequentes ao parto, mesmo quando contratada temporariamente pelo Estado, pelo que faz jus, neste caso, aos valores remuneratórios e previdenciários devidos desde a confirmação da gravidez até o 5º (quinto) mês após o parto.Respeitadas as repercussões pecuniárias, nenhuma restrição indevida incidirá sobre o universo jurídico da servidora, conforme orientação exaustivamente indicada.

 

5. Conclusão

Pelas razões expostas, entende-se pertinente reconhecer em favor das gestantes contratadas temporariamente, após comprovação do seu estado de gravidez, a proteção consagrada no artigo 7º, I e XVIII c/c artigo 39, § 3º da Constituição da República, bem como no artigo 10, II, ‘b’ do ADCT, com pagamento das remunerações e benefícios previdenciários relativos à função pública respectiva, desde a confirmação da gravidez até o quinto mês após o parto.

[1] Nesse sentido, confiram-se: ROCHA, Cármen Lúcia Antunes. Princípios Constitucionais dos Servidores Públicos. São Paulo: Saraiva, 1999, p. 120-121.

FREITAS, Juarez. Concurso Público e Regime Institucional: as Carreiras de Estado in Concurso público e constituição. Fabrício Motta (Coordenador). Belo Horizonte: Fórum, 2007, p. 127; 219.

ANASTASIA, Antônio Augusto Junho. Regime Jurídico Único do Servidor Público. Belo Horizonte: Del Rey, 1990, p. 51.

SILVA JÚNIOR, Arnaldo. Dos Servidores Públicos Municipais. Belo Horizonte: Del Rey, 2009, p. 28.

[2] “II – É cediço que a admissão de temporários, fundada no art. 37, IX, da Constituição Federal, atende necessidades transitórias da Administração e não concorre com a nomeação de efetivos, estes recrutados mediante concurso público (Art. 37, II e III da CF), para suprir necessidades permanentes do serviço.

III – São institutos diversos, com fundamentos fáticos e jurídicos que não se confundem, pelo que também a presença de temporários nos quadros estatais não pode ser tida, só por si, como caracterizadora da preterição dos candidatos aprovados para provimento de cargos efetivos.” (Agravo Interno em RMS nº 56.729-MG, rel. Min. Francisco Falcão, 2ª Turma do STJ, DJe de 18.06.2018)

[3] ANASTASIA, Antônio Augusto Junho. Regime Jurídico Único do Servidor Público. Belo Horizonte: Del Rey, 1990, p. 42-43

[4] MAIA, Márcio Barbosa e QUEIROZ, Ronaldo Pinheiro. O regime jurídico do concurso público e o seu controle jurisdicional. São Paulo: Saraiva, 2007, p. 44

[5] ADI nº 3.662-MT, rel. p/ acórdão Min. Alexandre de Moraes, Pleno do STF, DJe de 24.04.2018

[6] ROCHA, Cármen Lúcia Antunes. Princípios Constitucionais dos Servidores Públicos. São Paulo: Saraiva, 1999, p. 245

[7] CC nº 108.284-MG, rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, 3ª Seção do STJ, julgamento em 22.09.2010, Informativo 448 do STJ

No mesmo sentido: Apelação Cível nº 2003.71.12.004486-2, rel. Des. Marga Inge Barth Tessler, 4ª Turma do TRF da 5ª Região, DE de 20.07.2009

[8] RMS nº 32.025-PA, rel. Min. Mauro Campbell Marques, 2ª Turma do STJ, DJe de 10.11.2010

[9] RMS nº 29.462-BA, rel. Min. Felix Fischer, 5ª Turma do STJ, DJe de 14.09.2009

[10] “2. As situações flagrantemente inconstitucionais não estão submetidas ao prazo decadencial de autotutela administrativa. Precedentes.3. Logo, a contratação temporária de servidores públicos após a Constituição Federal de 1988 não é capaz de gerar estabilidade em cargos públicos, mesmo que sucessivamente prorrogada pela Administração Pública.” (RMS nº 56.774-PA, rel. Min. Mauro Campbell Marques, 2ª Turma do STJ, DJe de 29.05.2018)

[11] RMS nº 11.960-RJ, rel. Min. Gilson Dipp, 5ª Turma do STJ, DJU de 26.05.2003, p. 368

[12] RMS nº 30.651-PA, rel. Min. Eliana Calmon, 2ª Turma do STJ, DJe de 30.08.2010

[13] Apelação Cível nº 1.0024.06.994746-3/001, rel. Desembargador Armando Freire, 1ª Câmara Cível do TJMG, DJMG de 12.12.2008

[14] SILVA JÚNIOR, Arnaldo. Dos Servidores Públicos Municipais. Belo Horizonte: Del Rey, 2009, p. 126

[15] RE nº 287.905-SC, rel. p/ acórdão Min. Joaquim Barbosa, 2ª Turma do STF, DJU de 28.06.2005

Também o TJMG vem aplicando os direitos do artigo 39, § 3º da Constituição aos contratados temporários:

“EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL – REEXAME NECESSÁRIO – MANDADO DE SEGURANÇA- CONTRATO TEMPORÁRIO- LICENÇA GESTANTE- ESTABILIDADE PROVISÓRIA- PREVISÃO ARTIGOS 7º E 39, § 3º DA CR/88.

Aos servidores públicos são devidos os direitos previstos no art. 7º, da CR/88, que estejam elencados em seu §3º, do art. 39, dentre os quais está inserido o direito à licença-gestante.” (Reexame Necessário nº 1.0377.13.000445-2/001, rel. Des. Afrânio Vilela, 2ª  Câmara Cível do TJMG, DJMG de 26.06.2014)

No mesmo sentido: Apelação Cível nº 1.0245.13.012148-7/002, rel. Desembargador Marcelo Rodrigues, 2ª Câmara Cível do TJMG, DJMG de 26.11.2014.

[16] ADI nº 1.946-DF, rel. Min. Sydney Sanches, Pleno do STF Informativo n° 308 do STF

[17] MS nº 2009.03.00.029416-1, rel. Desembargador Henrique Herkenhoff, 1ª Seção do TRF da 3ª Região, DJF3 de 04.11.2009, p. 5

[18] RMS nº 26.069-MG, rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, 6ª Turma do STJ, DJe de 01.06.2011

[19] PAULA, Líria dos Santos. MUNIZ, Déborah Lídia Lobo. Licença-Maternidade: O aumento do período de afastamento para a mãe trabalhadora. Revista jurídica da UniFil, ano V, nº 5, p. 133, 135-136

[20] Apelação Cível nº 1.0245.13.003276-7/002, rel. Desembargadora Ana Paula Caixeta, 4ª Câmara Cível do TJMG, DJMG de 28.08.2014

[21] Apelação Cível nº 1.0245.13.012148-7/002, rel. Desembargador Marcelo Rodrigues, 2ª Câmara Cível do TJMG, DJMG de 26.11.2014

[22] Remessa Ex Officio nº 2010.36.00.004310-3-MT, rel. Juiz Federal Cleberson José Rocha, 2ª Turma do TRF 1ª Região, DJF1 de 19.07.2012, p. 119

[23] PEREIRA JÚNIOR, José Ricardo Britto Seixas. Da estabilidade à gestante ocupante de cargo em comissão. http://www.evocati.com.br/evocati/artigos.wsp?tmp_codartigo=600. Acesso em 13.01.2015

[24] Agravo Regimental no RE nº 634.093-DF, rel. Min. Celso de Mello, 2ª Turma do STJ, DJe de 06.12.2011

[25] Agr. Regimental no RMS nº 27.308-RS, rel. Min. Sebastião Reis Júnior, 6ª Turma do STJ, DJe de 28.10.2013)

No mesmo sentido: RMS nº 25.555-MG, rel. Min. Vasco Della Giustina (Des. Convocado do TJRS), 6ª Turma do STJ, DJe de 09.11.2011.

Também a jurisprudência dos demais Pretórios garante direito social às servidoras públicas, como a estabilidade provisória à gestante (Agravo de Instrumento nº 0265136-35.2014.8.13.000 (1), rel. Des. Lyrio Ramos, 8ª Câmara Cível do TJMG, DJMG de 01.12.2014; Apelação Cível nº 1.0026.13.004044-2/001, rel. Des. Rogério Coutinho, 8ª Câmara Cível do TJMG, DJMG de 01.12.2014; Apelação Cível nº 2011.000119-2, Acórdão nº 1192, relator Desembargador Luiz Cézar Medeiros, TJSC, julgamento em 29.03.2011 e Remessa Ex Officio nº 2008.34.00.036012-0, rel. Juíza Federal Kátia Balbino de Carvalho Ferreira, 2ª Turma do TRF da 1ª Região, e-DJF1 de 25.02.2010, p. 129), acentuando a importância de proteções como garantia de emprego e licença maternidade (RMS nº 22.361-RJ, rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, 5ª Turma do STJ, DJU de 07.02.2008 e Remessa Ex Officio em MS nº 2008.34.00.034530-5, rel. Desembargador Federal Francisco de Assis Betti, 2ª Turma do TRF da 1ª Região, e-DJF1 de 24.02.2011, p. 423; Apelação Cível nº 1.0024.11.064602-3/001, rel. Des. Alberto Vilas Boas, 1ª Câmara Cível do TJMG, DJMG de 11.06.2014 e Reexame Necessário nº 1.0377.13.000758-8/001, rel. Des. Vanessa Verdolim Hudson Andrade, 1ª Câmara Cível do TJMG, DJMG de 02.10.2014).

[26] Repercussão Geral no Recurso Extraordinário com Agravo nº 674.103-SC, rel. Min. Luiz Fux, julgamento em 03.05.2012, DJe de 18.06.2013; em 17.11.2014 o recurso foi substituído para julgamento de tema de repercussão geral pelo processo RE nº 842.844 que tramita de forma eletrônica em razão do despacho de 01.02.2018 (conclusos ao Relator em 27.09.2019).

No Tribunal de Justiça de Minas Gerais, já se identificava o seguinte entendimento: “AÇÃO ORDINÁRIA – SERVIDORA PÚBLICA DESIGNADA A TÍTULO PRECÁRIO – EXONERAÇÃO – ESTABILIDADE PROVISÓRIA – DIREITO CONSTITUCIONAL – PAGAMENTO DE REMUNERAÇÃO. O direito à estabilidade provisória em decorrência da maternidade é estendido às servidoras públicas, nos termos do §3º do art. 39 da Constituição da República de 1988 e do art. 10, inciso II, b, do ADCT, sendo que, não havendo o legislador originário feito qualquer restrição acerca da espécie de servidora abrangida pela garantia, não caberá ao intérprete fazê-lo. Portanto, tal direito deve ser reconhecido, às servidoras públicas de qualquer espécie, inclusive as contratadas por prazo determinado e ocupantes de cargo em comissão.” (Apelação Cível nº 1.0210.12.005987-3/003, rel. p/ acórdão Des. Dárcio Lopardi Mendes, 4ª Câmara Cível do TJMG, DJMG de 18.12.2014)

A matéria teve entendimento uniformizado pela 1ª Câmara de Uniformização de Jurisprudência Cível do TJMG em 20 de agosto de 2014:

EMENTA: INCIDENTE DE UNIFORMIZAÇÃO DE JURISPRUDÊNCIA. CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. MATÉRIA SOBRE O REGIME DA REPERCUSSÃO GERAL NO STF E CUJOS PRECEDENTES NÃO DIVERGEM ENTRE SI. CONHECIMENTO DO INCIDENTE. SERVIDORA PÚBLICA. FUNÇÃO PÚBLICA. VÍNCULO PRECÁRIO. CARGO EM COMISSÃO. GRAVIDEZ. DISPENSA DURANTE O PERÍODO GESTACIONAL. IMPOSSIBILIDADE. APLICABILIDADE DOS ARTIGOS 7º, XVIII, 39, §3º, DA CF, E 10, II, ‘B’ DO ADCT. DIREITO A ESTABILIDADE PROVISÓRIA. (…)

– Embora os servidores públicos civis contratados para cargo comissionado mantenham apenas vínculo precário com a Administração Pública, garante-se à servidora pública grávida a estabilidade provisória gestacional e a licença maternidade após o parto, e se lhe reconhece o direito à indenização por dispensa no aludido período quando a espécie se amolda ao art. 10, II, ‘b’, do ADCT. Precedentes do STF, STJ e desta Corte.” (Incidente de Uniformização de Jurisprudência nº 1.0567.10.004448-4/004, rel. Desembargador Alberto Vilas Boas, 1ª Câmara Unif. Jurisp. Cível do TJMG, DJMG de 05.09.2014)

[27] Confiram-se: Agravo Regimental no RE com Agravo nº 1.107.709-RS, rel. Min. Gilmar Mendes, 2ª Turma do STF, Dje de 16.08.2018; Agravo Regimental no RE com Agravo nº 766.127-PE, rel. Min. Dias Toffoli, 2ª Turma do STF, DJE de 17.05.2016 e Agravo Regimental no RE nº 830.962-MG, rel. Min. Luiz Fux, 1ª Turma do STF, DJE de 24.11.2014.

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